Viajar é uma das melhores experiências que existem. Das últimas vezes que viajei, eu voltei para casa com o pensamento "é por isso que eu trabalho, para poder viajar". Mais fantástico ainda é quando se viaja com amigos. Não há nada mais gratificante do que descobrir novos lugares com amizades que você tanto preza. É uma sensação que vai muito além do que um bem material pode proporcionar, pois é algo que só pode ser experienciado uma única vez. As lembranças de uma viagem são umas das maiores fontes de felicidade que existem. Viajar é uma experiência transformadora.
Isso que, por enquanto, minha experiência se resume a viagens dentro do Brasil, porque foram os únicos lugares que visitei até então, mas imagina o peso de uma viagem para a Antártida? Pois é isso que Sora Yori mo Tooi Basho mostra: uma jornada ao lugar mais longe que o universo, como diz o nome em inglês do anime, A Place Further Than the Universe. Enquanto ainda era exibido (com apenas 4 episódios lançados), escrevi um texto sobre como a obra aborda aspirações, em que digo que o anime poderia se tornar um dos melhores do ano. Dito e feito.
HISTÓRIA
OBS.: Recomendo que leiam o texto supracitado em que falo em detalhes sobre cada uma das protagonistas e seus anseios.
Sair em uma jornada. Fugir da rotina. Aproveitar a juventude. Essas são as vontades pulsantes da Mari Tamaki, uma estudante do ensino médio que sente estar desperdiçando essa fase da vida. Ela é uma menina que vive com a cabeça nas nuvens, um pouco atrapalhada, mas muito amigável e sempre sorridente. Porém, é insegura de suas capacidades, então realizar seus próprios desejos acaba se tornando algo complicado.
Sua vida começa a tomar um rumo diferente quando encontra no chão um envelope com 1 milhão de ienes dentro. Esse pertence à Shirase Kobuchizawa, uma moça de aparência esguia e personalidade bipolar, da mesma escola da Mari. Ao devolver o dinheiro, a Shirase revela qual a finalidade dessa grana – financiar uma viagem à Antártida.
Sua mãe, Takako Kobuchizawa, fazia parte de uma equipe de expedição ao Polo Sul e escreveu um livro sobre o lugar de tanto que o adorava, mas em uma de suas viagens, nunca mais voltou para casa. Desde então, a Shirase anseia em ir ao gélido continente por conta própria para descobrir o que aconteceu com ela.
Ao ouvir essa história e se sentir inspirada pela determinação da Shirase, a Mari pensa "pronto, é essa a jornada que eu estava procurando" e decide se juntar a ela. A menina passa a trabalhar em uma lojinha de conveniência para juntar mais dinheiro, onde conhece a Hinata Miyake, uma garota extrovertida da mesma idade delas. Ao ouvi-las conversando sobre esse plano de ir à Antártida, ela também se junta ao time, dizendo que estava cansada da monotonia dos seus dias, apesar de essa não ser a verdadeira razão...
Mas ir ao Polo Sul não é uma missão simples para estudantes do ensino médio. Nem mesmo todo dinheiro do mundo conseguiria colocá-las em um navio devido às complicações legais e burocráticas. É aí que entra em cena a Yuzuki Shiraishi, uma atriz mirim que foi cotada para fazer reportagens na Antártida voltadas ao público jovem. O desfecho não poderia ser outro: as meninas se tornam amigas dela e assim se inicia a viagem que transformará as suas vidas.
ESTILO
Existe um preconceito forte por parte do público ocidental com animes do gênero slice of life, especialmente por aqueles protagonizados por meninas fofas, um subgênero conhecido como CGDCT, sigla para cute girls doing cute things (garotas fofas fazendo coisas fofas). Quando vêem uma imagem da obra e percebem que esse é o seu estilo, logo é dispensada ou assistem com um pé atrás.
K-ON! (meu review) foi o responsável pela popularização desse gênero que infestou a indústria de animes, para o desprezo de muitos. Mas enquanto diversos desses trabalhos se assemelhavam à superfície de K-ON!, ou seja, à parte da fofura e da comédia, poucos conseguiam absorver a essência da obra – sua humanidade, a maneira como trabalha as relações entre as personagens de maneira sensível e sentimental.
Sora Yori mo Tooi Basho se enquadra neste gênero. As garotas são definitivamente fofas, mas não é aquela fofura exacerbada de séries como K-ON!, Tamako Market (meu review) e Love Live. Elas são mais maduras se comparadas com as personagens desses exemplos, até mesmo as mais ingênuas. Isso se deve ao fato de que a obra não se resume ao gênero CGDCT, já que também é uma aventura. As protagonistas vão à Antártida, cara. Se essa viagem não é tratada com seriedade, fica difícil de nós, como espectadores, a levarmos a sério.
Mas isso não quer dizer que não existam momentos divertidos, muito pelo contrário – a comédia é um dos pilares que sustentam o anime. A começar pela química entre as quatro protagonistas, uma representação perfeita de amizades do ensino médio. Elas zoam umas as outras, riem de bobagens, têm discussões por conta de conflitos toscos, soltam indiretinhas sobre a personalidade uma da outra... É difícil de não se divertir com suas interações porque é muito reminiscente dos nossos tempos de escola ou de faculdade.
O trabalho de caracterização faz com que cada uma delas sejam únicas, tanto em relação a elas mesmas quanto aos famosos arquétipos de anime, já que suas personalidades não são tão fáceis de se classificar como acontece com muitas personagens. Talvez a única exceção a isso seja a Mari, muito parecida com a Yui de K-ON!. Mas isso não é um demérito, pois ela é divertidíssima com sua personalidade ingênua, avoada e meio boba.
Isso que eu chamo de pudim! |
A Shirase é a mais bipolar das quatro, da qual vemos diversas faces de sua personalidade. Hora vemos sua postura de austeridade ou como se desespera diante de algumas situações. Hora vemos seu fascínio desmedido por pinguins ou como congela em frente às câmeras. Hora vemos explosões de felicidade ou como responde certas pessoas de forma seca. Todas as personagens do anime têm suas camadas, mas a Shirase certamente é a com o maior número delas.
As múltiplas faces de Shirase Kobuchizawa. |
A Hinata está sempre com um sorriso no rosto e se acha a voz da razão em diversos momentos, ao proferir citações filosóficas de si mesma para impressionar suas amigas. A Yuzuki, apesar de ser a que mais acho fofa, não tem tantas características cômicas. Se há algo que acho engraçado nela é como se torna outra pessoa diante das câmeras. Se ela está emburrada antes de começar uma gravação, é só ouvir o clique da câmera que parece ser possuída pelo espírito do extrovertismo e da felicidade.
"Quem diz isso?", "Eu!" |
Uma verdadeira profissional. |
Porém, é no segundo pilar que vemos como Sora Yori nos trouxe algumas das personagens mais humanas de qualquer anime da história – o pilar do drama pessoal. Assim como cada uma têm suas características cômicas, elas também têm seus problemas individuais que são explorados com profundidade.
O conflito interno da Shirase sobre a possibilidade de ter perdido a sua mãe, o sentimento da Mari de não estar aproveitando devidamente sua juventude, o anseio da Yuzuki por amizades de verdade, a vontade da Hinata de fugir do que a incomoda e começar tudo do zero... Esses e outros problemas que afligem a vida dessas adolescentes são tão bem desenvolvidos que voltarei a falar deles mais a frente em uma seção específica.
E não é só por conta dos problemas que enfrentam que consigo enxergá-las como pessoas de verdade, mas também por conta de suas caracterizações que mostram suas imperfeições, seus medos e as falhas em suas personalidades. O lado vingativo e egoísta da Shirase, a inabilidade da Hinata em lidar com as pessoas em situações introspectivas, a insegurança da Mari em mudar sua rotina, o desprazer da Yuzuki com sua profissão... É tudo muito tangível, fácil de se identificar. Eu não me sinto assistindo a desenhos de personagens se movimentando, mas sim a vida real de quatro garotas em sua jornada à Antártida.
Isso também se deve à execução formidável dessa jornada. Os roteiristas poderiam ter escolhido a "rota previsível" e ter feito as garotas se conhecerem e já partirem para a Antártida logo no começo do anime. Mas sabe quando elas chegam lá? Apenas no décimo episódio, de um total de 13.
Antes disso, nos é mostrado todo o processo de preparação para ir ao continente, desde um treinamento numa área montanhosa, a viagem de avião com uma pausa em outro país e toda a viagem de navio rumo à Antártida, com todos os percalços que ela proporciona. Em todas essas situações o lado pessoal das personagens é sempre explorado, tornando essa jornada inteira incrivelmente envolvente.
O treinamento nas montanhas, com direito a acampamento. |
Só de ver o rosto da Shirase eu já fico enjoado de imaginar a sensação de uma viagem de navio. |
Eu sinto a necessidade de tirar meu chapéu para o roteirista da série, Jukki Hanada, por sua habilidade em manter um balanço harmonioso entre drama e comédia. Um jamais sobrepuja o outro e nada é exagerado. Eu me irrito facilmente com comédia em momentos inoportunos e drama forçado, mas esse não é o caso aqui, graças à competência do Hanada.
Não é de se espantar que o roteiro seja excelente, visto que ele também trabalhou em K-ON! e Hibike! Euphonium (review em breve), dois animes com os quais criei um vínculo sentimental forte graças ao seu conteúdo humano e inspirador. Outros trabalhos seus incluem Nichijou (meu review) e Chuunibyou demo Koi ga Shitai (meu review), aos quais já escrevi sobre aqui no blog.
Incrível como um homem de 40 e poucos anos consegue escrever histórias críveis sobre adolescentes que capturam a essência de ser jovem. |
E vale mencionar que Sora Yori mo Tooi Basho é um anime original, ou seja, não é uma adaptação de mangá ou livro, algo pouco comum na indústria. Todos assistiram a um trabalho inédito, sem ter qualquer outro material para se basear no que estavam vendo. Comentários do tipo "mas o mangá é melhor" felizmente não puderam existir.
ARTE
Esse ano decidi, pela primeira vez, assistir a alguns animes de temporada que me chamassem a atenção e este foi o primeiro deles. Seu poster com garotas fofas e um navio de fundo me pareceu interessante. Aí li a sinopse e pronto, comecei a acompanhar ao longo das semanas. Pode-se dizer então que o principal motivo de ter feito isso foi por conta de seu visual, mas eu não imaginei que o anime se destacaria tanto nesse departamento.
O design das personagens é bastante agradável, daquele tipo que faz com que você as ache carismáticas sem nem saber de suas personalidades, principalmente por conta dos rostos fofos. O designer, Takahiro Yoshimatsu, procurou manter os corpos com proporções realistas, sem deformações típicas de anime, até mesmo em cenas mais expressivas, afinal, realismo é um dos pontos fortes do anime. E expressividade é o que não falta quando o assunto é o rosto das personagens, desde expressões de espanto, tristeza e sorrisos que você dificilmente deixará de sorrir junto.
Um aspecto que me chamou a atenção foi a distribuição de cores que faz uso de tons menos vibrantes que o comum e pouco contraste. A saturação da obra raramente chega a níveis fortes. Não sei se existe uma explicação psicológica pra isso, mas sinto que essa abordagem torna a arte – e o que ela apresenta – mais intimista, talvez pela sensação de leveza que transmite.
Uma comparação da paleta de cores de cenas similares entre Sora Yori e K-ON!. Note como K-ON! é mais saturado e contrastado, enquanto Sora Yori faz um uso maior de cores pastéis. |
Essa distribuição de cores se comunica perfeitamente com os cenários da série, pinturas que você poderia confundir com uma fotografia se olhasse de longe de tão realista que são. Inclusive, eu acredito que essa abordagem de se parecerem com fotos seja intencional, já que um dos temas centrais de Sora Yori é o ato de viajar. O que mais marca uma pessoa em uma viagem? As paisagens, que sempre parecem fantásticas, pois são algo fora da sua realidade. Então, fotos são tiradas.
E claro, não pode faltar aquela foto de pose tosca em frente a um ponto turístico! |
Os grandes destaques do anime vão para os cenários de Singapura e, obviamente, da Antártida. Se você se apegou emocionalmente à jornada das garotas como eu, ver essas maravilhas faz com que se sinta ali. Acima, disponibilizei algumas imagens da visita delas a Singapura, com esse trabalho fantástico de cenários que foi elogiado pelo pessoal do país como 100% fiel, não só por sua representação das paisagens, mas também por elementos da cultura singapurense, como sua culinária. Abaixo, deixo imagens comparativas do interior do navio antártico. Vejam que lindeza.
E não posso deixar de compartilhar essas paisagens de tirar o fôlego do Polo Sul. Acho que esse é um exemplo primordial do poder de uma animação. Sempre que via imagens da Antártida, seja na internet ou em filmes – os quais muitas vezes a representam apenas como palco de tragédias, vale notar –, eu não achava nada demais. Só um monte de gelo e água.
Já as paisagens de Sora Yori trazem consigo diversos sentimentos que são compartilhados comigo, pois fazem parte do destino final dessa jornada envolvente, onde as garotas enfrentam seus maiores problemas pessoais e fortalecem o laço que as une. Todos estes cenários com suas montanhas, campos de neve e lagos extensos se tornaram encantadores. O vislumbre de uma aurora boreal então, nem se fala. É de encher os olhos de lágrimas.
Mas o que mais me surpreendeu foi como isso tudo é administrado com maestria por uma moça chamada Atsuko Ishizuka, a diretora. Esse é o primeiro trabalho que assisto dela e já fiquei fascinado por seu estilo, apesar desse parecer um trabalho mais "pé no chão" em relação aos seus outros, especialmente ao seu maior sucesso, No Game No Life, um anime que se passa num mundo virtual, cheio de ação e conteúdo sexualmente sugestivo, basicamente o oposto da obra que estou analisando.
Outro ponto positivo do anime: fanservice não existe! E essa cena é L I N D A. |
Seu trabalho em Sora Yori é parecido com o estilo da Naoko Yamada, uma diretora que amo de paixão (leia aqui o porquê). Sua execução cheia de sensibilidade tornou mais impactantes os diversos momentos introspectivos e emocionantes do anime, ao fazer uso de pequenas nuances e sutilezas de forma com que estes parecessem naturais como a vida. Mas palavras não são suficientes para descrever o excelente trabalho de Ishizuka, então vamos a alguns exemplos visuais, a começar pelo momento de reflexão da Yuzuki após seu primeiro encontro com as garotas:
Ao lembrar da sensação agradável de ser abraçada por alguém, ela se agarra ao seu travesseiro. |
Depois de ter um sonho com as meninas, a Yuzuki abre a janela e fica parada, até que começa a rir bem baixinho. |
Essa condução torna possível que momentos como esse sejam legitimamente emocionantes. |
Já no primeiro episódio da série a diretora nos mostra a sua habilidade em representar o estado emocional de uma personagem por meio de planos que sequer mostram seu rosto. Os exemplos a seguir retratam a insegurança da Mari em tomar ações para aproveitar melhor sua juventude e também seu descontentamento com essa inabilidade, apenas com enquadramentos das suas mãos, pernas e de seus arredores.
Esse plano tem outro contexto dos demais, mas o incluí aqui para verem que enquadramento fantástico. |
Mas não é só em cenas mais pessoais que a direção de Ishizuka brilha. O trecho cômico a seguir é um baita exemplo disso. Uma cena com uma ambientação que lembra um filme de terror, contraste forte entre luz e sombras, e diversos planos detalhes (a faca e a panela fervendo aumentam a tensão drasticamente!), mas que deixa explícito o iminente desfecho hilário da situação. Essa não dá para ser representada apenas por imagens, preciso compartilhar o vídeo dela.
A direção também é beneficiada pelo trabalho de animação da Madhouse, estúdio famoso justamente pela consistência na animação de suas obras. Esse combo de direção e animação formidável nos trouxe uma das cenas de corrida mais exuberantes da história dos animes, com uma animação tão expressiva e intensa que dá até pra sentir o peso dos passos acelerados das meninas.
O cenário, cheio de luzes e cores que se misturam à medida que elas avançam, torna tudo ainda mais incrível, assim como a direção que explora cada canto do local e mostra a interação das personagens com o espaço. Assim como a própria Mari coloca, é uma cena que te faz sentir o que é "estar em movimento".
O trabalho artístico de Sora Yori, desde a direção, a paleta de cores e os cenários fotorrealistas, é perfeito para representar a experiência idiossincrática que a obra oferece. Unida de um roteiro tão admirável quanto, a arte torna quase que palpável todas as situações enfrentadas pelas personagens.
ÁUDIO
A trilha sonora dessa série é uma delicinha. Acho que não tem palavra melhor para descrevê-la. Grande parte de suas composições tem uma pegada folk e country, com uma mistura de violão, piano e bateria como os instrumentos proeminentes. Elas transmitem uma sensação de conforto e combinam bastante com o estilo mais descontraído da primeira metade do anime.
Quando as meninas vão à Antártida, temos uma quantidade maior de músicas lentas e calmas, quase atmosféricas, movidas inteiramente ao som do piano e às vezes uma orquestra de fundo. Se você deitar no escuro enquanto ouve essas composições, é capaz que consiga se imaginar no meio de uma geleira. Como o clima da série se torna mais reflexivo nessa segunda metade, foi uma ótima escolha optar por músicas mais contemplativas para refletir a situação que as personagens se encontram.
(música que toca em 1:17:18 do vídeo)
São poucas as peças mais bombásticas, orquestradas, grandiosas, mas elas existem, pois o anime têm seus momentos de explosão de emoções, e essas composições cumprem sua função em fazer com que você "exploda" junto, sejam esses momentos de felicidade ou tristeza.
Porém, grande parte das situações emotivas não são acompanhadas por trilhas instrumentais, mas sim por músicas cantadas, as famosas insert songs. Ao escutá-las separadamente, é difícil de imaginar que cairiam bem em cenas como as de choro ou de superação pessoal, mas é incrivel como combinam lindamente. É algo que não dá para descrever, é preciso ouvi-las durante a série para sentir a sinergia.
E por falar em músicas cantadas, é claro que não poderia de deixar de falar sobre a abertura. Eu amo tanto essa série que não consigo evitar de me emocionar sempre que a escuto. Até comecei a aprender a tocá-la no teclado, apesar de ser complicadinha para o meu nível. Sua sonoridade representa perfeitamente essa aventura. Para mim, ela começa transmitindo uma mensagem de "vamos levantar da cama e andar em direção a uma jornada", até que chega ao refrão, onde a jornada começa pra valer.
A animação da abertura mostra isso claramente ao se iniciar com a Mari virando a câmera de ponta-cabeça, que é basicamente o que ela fará com sua vida ao embarcar nessa aventura. Os diversos planos delas se divertindo na Antártida podem passar a impressão de que não enfrentarão adversidades, o que está longe de ser o caso. Esses planos comunicam o lindo vínculo que as garotas criam neste panorama expansivo, onde seus futuros começam (parte da letra da abertura). O nome da música não poderia ser outro: The Girls are Alright!. Elas definitivamente não poderiam estar melhores.
O encerramento também é uma maravilha, ainda mais por ser cantado pelas quatro garotas viajantes. Sinceramente, não acho que eu precise fazer uma análise detalhada de todas as openings e endings que adoro para fundamentar o porquê de eu adorá-las. Eu simplesmente amo o encerramento de Sora Yori mo Tooi Basho e é isso. Se você, como eu, criou um vínculo forte com a obra, sabe como é se emocionar só de ouvir as notas de piano ao início da canção.
O trabalho de dublagem (japonesa) é ótimo, adoro as vozes de todas as personagens, especialmente das protagonistas, mas preciso dar destaque à dubladora da Shirase, Kana Hanazawa, com sua fantástica atuação que exalta toda a excentricidade da personagem e suas constantes mudanças repentinas de comportamento.
JORNADA INTERIOR
AVISO: Essa seção contém spoilers! Apenas leia se já tiver assistido à série.
Eu abri o texto dizendo "imagina o peso de uma viagem para a Antártida", mas a verdade é que o destino das garotas de Sora Yori poderia ser qualquer outro que o resultado seria o mesmo, pois o foco não está no lugar, mas sim na experiência pessoal e interpessoal de cada uma delas. A Antártida é só um plano de fundo para o desenvolvimento de suas personalidades e o palco para a evolução das meninas.
Quando escrevi meu texto sobre os anseios e aspirações delas, considerando apenas os três primeiros episódios, falei que a Hinata era a única que estava indo para a Antártida só por ir, sem um motivo pessoal como as outras, mas rapaz... Como eu estava errado. Acontece que as ambições das outras três meninas são perceptíveis logo quando somos introduzidos a elas, já com a srta. Miyake não é bem assim, porque, por incrível que pareça, ela é a mais reservada quando o assunto é si mesma.
Sim, a Hinata procura sempre mostrar sua face extrovertida quando está em grupo e geralmente é a primeira a dar palpite na vida das outras quando qualquer coisa ocorre, mas quando os holofotes se tornam em direção a ela, vemos uma face sua que poucos conhecem. A Hinata não consegue lidar com outras pessoas se preocupando com ela. Prefere sofrer sozinha, pois não sabe como reagir em situações assim.
A cena a seguir a mostra colocando toda a culpa de determinada situação em suas costas para evitar que tentem argumentar com ela, mas as coisas não saem como planejado, o que gera um comportamento quase que agressivo por sua parte. Mais tarde, ela tenta se desculpar por ter agido dessa maneira, mas isso só piora a situação, pois a Shirase acaba se preocupando mais ainda e o desconforto da Hinata fica evidente em suas respostas secas. É uma pessoa que se acha autossuficiente, que não precisa de ajuda para viver.
O motivo da Hinata querer participar dessa viagem foi para fugir o mais longe possível dos problemas que a afligiam nos lugares que frequentava, em especial na escola, onde foi prejudicada por pessoas que se diziam suas amigas. Ela queria esquecer tudo, recomeçar do zero. É algo que muitos de nós, dada a oportunidade, certamente faríamos. Fugir da pressão da faculdade ou dos rostos falsos que temos que conviver no trabalho. A Hinata escolheu deixar tudo para trás e se isolar no lugar mais longe que o universo.
Mas fugir nunca é a melhor solução. Essas situações precisam ser enfrentadas para que a pessoa se torne mais resiliente. Quando os fantasmas do seu passado aparecem para atormentá-la até mesmo na Antártida, a Hinata se vê encurralada. Não tem mais para onde fugir. É então que suas amigas entram em cena e mostram a necessidade de superar aquilo que lhe incomoda. Elas confrontam as falsas amizades de sua amiga e dão um passo a frente por ela, que até então estava dando apenas passos para trás.
Com esse evento, a importância de se abrir para aqueles que prezam por você fica evidente à Hinata. Seus dois maiores conflitos caminham em direção a uma resolução. |
Um detalhe incrível de execução dessa série é que, no episódio 5, vemos um take da Hinata observando um par de tênis com uma expressão de desconforto em seu rosto, mas somente no episódio 11 que conseguimos entender o sentido desse take, quando descobrimos o principal evento que fez com que ela embarcasse nessa viagem. São detalhes assim que proporcionam uma experiência mais rica ao reassistir o anime.
O conflito da Yuzuki pode parecer o mais simples de todos, mas há muito além do que os olhos vêem. O problema começa pelo fato de ser forçada a seguir uma vocação que não quer por pressão da sua mãe. Fica difícil de sentir satisfação quando se é forçada a fazer algo que não gosta, seja por influência de parentes ou por alguma inabilidade pessoal, como ter que aceitar um emprego por dificuldades financeiras ou por não ter a capacidade de achar um melhor.
Isso faz com que a menina não tenha tempo para si mesma, para curtir a vida com as amigas. Pior ainda, o fato de ser famosa faz com que as pessoas se aproximem dela com segundas intenções, o que torna seus relacionamentos superficiais. O maior anseio da sua vida é ter amizades de verdade, apesar dela parecer ter se convencido de que isso não acontecerá, dada a sua situação.
Mas claro, seu desejo vem à fruição quando conhece a Mari, a Hinata e a Shirase, com as quais passa a desenvolver um laço fortíssimo de amizade durante a jornada. Eu vi pessoas criticando esse conflito da Yuzuki, chamando-o de raso. Esses indivíduos não devem saber o que é ter poucas amizades e a solidão que isso proporciona. Já eu me identifico em demasia com a situação dela, por conseguir contar nos dedos as verdadeiras amizades que tenho.
Eu me identifico tanto com ela que consigo sentir exatamente o que se passa dentro dela durante diversos momentos da viagem. Os meus melhores amigos moram em outros estados, então não existe sensação mais satisfatória do que viajar junto deles. As risadas se tornam mais gostosas, as paisagens parecem mais bonitas, a atmosfera se torna mais leve... São experiências que ficarão para sempre na memória, assim como essas que a Yuzuki viveu ao lado dessas pessoas tão especiais para ela.
A sua mudança de personalidade é muito gratificante de se ver. Quando é introduzida, ela está sempre com o rosto fechado, e mesmo depois de fazer amizade com as meninas, ela ainda tem seus momentos de incerteza. Mas ao decorrer dos eventos, esse rosto fechado vai se abrindo cada vez mais e não há nada mais confortante do que o sorriso radiante que passa a tomar conta do seu rosto em grande parte das ocasiões, um sorriso de alguém que finalmente achou a felicidade que tanto procurava em sua vida.
A Shirase é uma das personagens mais complexas e bem construídas de qualquer anime que já assisti. Conforme falei na seção ESTILO, ela tem diversas camadas de personalidade. Isso se deve ao evento que passou a ditar o rumo de sua vida – o sumiço de sua mãe. Tudo que a garota fazia era em prol disso. Nada a impediria de sua missão de ir à Antártida. Precisou abrir mão de todo o seu lazer para juntar a quantia exorbitante de 1 milhão de ienes. Essa obstinação a trouxe diversos problemas sociais, pois se tornou reclusa, temperamental e alvo de maus olhares na escola.
Seu gênio forte é certamente a sua característica definitiva. Não se deixa abalar por nada, mas guarda um enorme rancor daqueles que duvidam dela. São essas imperfeições que fazem dela uma personagem tão humana, afinal, nenhuma pessoa é perfeita. Se não fosse por essa personalidade, não seríamos presenteados com um dos momentos mais satisfatórios da jornada, quando a Shirase chega à Antártida e bota pra fora tudo aquilo que tava entalado na garganta.
No meu texto anterior sobre as personagens, eu fecho a seção da Shirase me perguntando se ela aprenderia a pensar nos sentimentos dos outros e não só nos dela, pois sua obstinação a tornara uma pessoa egoísta. Fico feliz que minha resposta tenha sido respondida com um grande SIM! Acredito que um dos métodos mais efetivos de se conscientizar dos seus próprios erros é ser criticado por um amigo (experiência própria), algo que a Hinata faz com a Shirase. A partir disso, junto do vínculo que se fortalecia a cada dia com suas amigas, ela passa a ser mais caridosa.
Mas quando seu gênio forte e sua preocupação com as amigas se juntam, não tem quem a segure. Eu falei anteriormente sobre as falsas amizades da Hinata que voltam para atormentá-la, né? Ela pensa em perdoá-las contra sua própria vontade para deixar isso de lado, mas a Shirase jamais permitiria que sua amiga fizesse isso. Ela anda em direção à câmera que estava fazendo uma transmissão a essas pessoas indesejáveis e, em frente a toda equipe da expedição, solta um belo de um:
Quando a Shirase chega à Antártida, a sua personalidade se torna completamente diferente. Toda a determinação e excentricidade que demonstrava antes da viagem simplesmente desaparece em diversos momentos. O pensamento de que está trilhando os mesmos passos de sua mãe, prestes a descobrir a resposta da questão que conduziu a sua vida durante tantos anos, enche essa garota de medo, incertezas e questionamentos.
É então que o episódio 12 acontece. Uma simples cena de uma tela de notebook mostrando a caixa de entrada de um e-mail conseguiu me fazer chorar um mar de lágrimas, assim como as meninas. Me senti como um quinto integrante do grupo. A mãe da Shirase morreu. Isso é transmitido por uma cena com uma carga emocional tão forte quanto um corpo morto, porém muito mais sutil – uma infinidade de e-mails começa a brotar na tela do notebook da falecida, todos da Shirase, que os enviava na esperança de que sua mãe os recebesse.
"Querida Mamãe"... A jornada de Shirase chega à conclusão que tanto temia.
A direção e distribuição de cores dessa cena ajudam imensuravelmente a torná-la íntima. |
A sala escura, iluminada somente pela tela do monitor, transmite a sensação de desolação, aperto e enclausuramento que a Shirase sente nesse momento. |
Ao sentir todo esse sufoco, minha reação foi exatamente essa. E que animação expressiva, tanto delas quanto da Shirase. |
Li comentários dizendo que se a série tivesse terminado neste episódio, seria fantástico, mas eu discordo ferrenhamente. O conteúdo de Sora Yori preza a superação pessoal, não faria sentido acabar com todo mundo chorando. O sentimento que querem passar a quem assiste é de realização, gratificação e evolução. Como eu me envolvi emocionalmente a um nível tremendo com essas personagens e com a jornada delas, foi exatamente assim que me senti.
A maneira como a Shirase supera esse evento é o ápice de realização, gratificação e evolução. Ela corta seu longo cabelo afim de que fique curtinho e coloca em seu rosto um enorme sorriso cheio de dentes, pronta para começar uma nova fase da sua vida. As risadas que deu, as adversidades que enfrentou, as lágrimas que derramou e tudo que essa jornada lhe proporcionou a transformaram de corpo e alma.
Um sorriso que ilumina até a alma. |
E para fechar o quarteto, temos a Mari. Essa mocinha, com seu anseio de aproveitar melhor a juventude, foi quem me prendeu durante o primeiro episódio e me fez pensar "ok, esse anime parece ser melhor do que eu imaginava". Essa sua vontade ardente de mudar sua rotina, sair em uma jornada e os medos que a impediam de satisfazê-la fizeram com que eu me identificasse instantaneamente com a personagem. Em apenas um único episódio, ela já havia ganhado meu coração, não por sua aparência ou personalidade, mas por suas aspirações e pela maneira como lidava com estas.
Eu não sei se muitos lerão meu texto anterior sobre esse anime, então preciso transportar para cá dois parágrafos que escrevi em relação à Mari:
"Apesar de eu não estar mais na adolescência, consigo me relacionar com facilidade com a situação dela. Acho que muitos de nós sentimos vontade de fazer algo de diferente, de nos aventurar, mas não conseguimos por diversos medos ou por puro comodismo. Começar uma nova faculdade depois de ter cursado outra, praticar um esporte que não está familiarizado, aprender a tocar um instrumento sem ter noção de música, aprender a desenhar sem ter começado na infância...
Esses são alguns exemplos de atividades que muitas pessoas – eu incluso – sentem vontade de fazer, mas são aflitas por um medo. Ao mostrá-la abraçando de corpo e alma essa nova aventura para realizar seu desejo e superar seus medos, creio que aqueles que se identificaram com a personagem serão inspirados e ganharão um pouco do combustível necessário para quebrar essa barreira que bloqueia seus caminhos".
Depois dos episódios iniciais, não é dado nenhum foco aos conflitos individuais da Mari, pois não há mais margem para eles existirem, já que ela está vivendo o seu sonho. Diferente das outras meninas, a única coisa que a afligia era sua inabilidade de se arriscar, de sair do comodismo, problema o qual ela consegue superar ao se inspirar na determinação da Shirase. O foco agora é dado à expansão de horizontes da Mari durante a jornada, reflexões que nunca haviam pairado em sua cabeça antes.
Um dos momentos que mais me pegou desprevenido foi no penúltimo episódio, quando as garotas estão deitadas, em silêncio, duas delas já dormindo, até que a Mari se vira para a Shirase, com apenas seu rosto fora da coberta, e a agradece pela oportunidade de poder viver essa jornada. Ao vê-la chegar a essa realização, agradecendo sua amiga com tamanha ternura e honestidade, eu não me aguentei. Parece um diálogo clichê, mas, além da execução ter sido tão natural, o vínculo que criei com essas personagens fez com que essas simples palavras se tornassem incrivelmente impactantes.
Mas não é só em suas protagonistas que o desenvolvimento de personagens de Sora Yori mo Tooi Basho brilha. Essas questões pessoais também são abordadas nas figuras secundárias. A Gin Toudou, líder da equipe de expedição, é visivelmente atormentada pela morte da mãe da Shirase. Pensa sem parar em seus momentos finais e chora diversas vezes quando está sozinha. Mas mesmo assim ela segue em frente e lidera sua equipe em meio ao continente gelado com muita garra, a fim de honrar os desejos de sua falecida amiga.
É interessante o relacionamento dela com a Shirase. As duas não se falam tanto, parecem que sentem receio uma da outra. Desde a infância da Shirase, a Takako tentava arranjar momentos para que as duas ficassem sozinhas, já que sabia que sua filha participaria de expedições no futuro, então seria bom se elas tivessem afinidade. Apesar disso, a Gin sempre foi austera, algo que se intensificou em sua personalidade depois que a Takako faleceu. Esse evento parece ser o motivo principal desse receio entre elas, pois acaba sendo uma barreira para a Gin encarar a filha da sua amiga que morreu durante uma expedição que participou.
Gin junto da Shirase criança. |
Porém, depois de um tempo na Antártida, as duas passam a se abrir mais em suas breves conversas, pois é isso que uma expedição dessas proporciona, assim como a Shirase expôs em um magnífico discurso ao fim de sua estadia no continente:
"Este é um lugar que desnuda tudo. O tempo, a vida, os corações... É um lugar onde não há nada para te proteger nem onde possa se esconder. Neste ambiente que expõe tudo, colocamos para fora o que nos envergonha ou o que queremos esconder e, de coração desnudo, enquanto choramos, fomos forçadas a enfrentar quem somos".
Um discurso que emocionou até a rígida capitã. |
Talvez a mais marcante das personagens secundárias seja a Megumi Takahashi, amiga de infância da Mari. Ela funciona como sua voz da razão, é quem sempre dá conselhos a essa menina avoada. Ela tenta ajudá-la com sua missão de aproveitar melhor a juventude, mas não bota muita fé de que conseguirá, dada a sua personalidade.
Porém, as coisas começam a mudar. Ao conhecer a Shirase, a Mari passa a ficar mais confiante, até que uma jornada à Antártida se torna realidade. Sua dependência à sua melhor amiga começa a desaparecer, mas a Megumi não parece feliz com isso. É possível perceber um certo incômodo por parte dela com essa viagem. Um dia antes da partida da Mari, ela aparece com umas conversas como se quisesse impedi-la de viajar.
É então que a Megumi mostra seu lado egoísta – foi ela quem espalhou rumores negativos sobre a Mari e suas companhias, para ver se isso a impedia de viajar, para que continuasse sendo a garota insegura que dependia dela pra tudo, pois isso a agradava. Ela não queria o sucesso de sua grande amiga por conta disso. Quando viu que a Mari ganhou autoconfiança e se tornou autossuficiente, ela não precisaria mais de sua ajuda em tudo que fazia. Para a Megumi, era a isso que se resumia sua amizade. Na verdade, quem dependia uma da outra era a Megumi da Mari.
Esse enquadramento magnífico simboliza a liberdade da Mari, agora independente de sua amiga, enquanto a Megumi se sente presa por barreiras que a cercam. |
Isso é muito relacionável, pois inveja é algo inerente ao ser humano. Devo admitir que eu já fiquei com inveja do sucesso de algumas amizades, não queria que fossem melhores do que eu, o que é exatamente o caso dessas duas. Ou melhor, era, pois ao final da série vemos como as ações da Mari acabaram inspirando a Megumi a sair em sua própria jornada, a deixar de lado o comodismo que sua relação com sua melhor amiga proporcionava.
É nesse campo que Sora Yori sucede com maestria, em inspirar pessoas a se descobrirem, a terem suas jornadas, sejam elas de pequena ou grande escala. Eu digo isso pois sei que não sou o único a ser inspirado por essa obra. Nessa playlist do YouTube eu incluí vídeos com depoimentos pessoais do quão importante esse anime é para essas pessoas, algumas delas já com mais de 25 anos. Eu me emocionei assistindo diversos deles, pois é fácil de perceber como elas falam do coração. Algumas não são análises, e sim cartas de gratidão.
Esse é um dos poucos animes que posso falar que vai além de um simples desenho animado para ser assistido. Não, ele transcende essa definição – é uma experiência para ser absorvida. Eu já usei esse elogio "é mais do que um anime, é uma experiência" quando falei sobre The Disappearance of Haruhi Suzumiya (meu review), mas é um caso diferente. Disappearance foi uma experiência única por ter subvertido todas as expectativas negativas que adquiri depois da série fraquísisma e, assim, ter me deixado vidrado na tela durante suas 2 horas e 41 minutos de duração.
Sora Yori é uma experiência devido ao fato de que seu conteúdo se agrega às minhas ações e pensamentos. Não é apenas uma experiência audiovisual fantástica, como Disappearance. É uma obra que, assim como o nome dessa seção diz, me propôs uma jornada interior. Despertou meu anseio de viajar, de ter novas experiências, conhecer lugares fora da minha realidade e isso já tem data marcada para acontecer.
Vou para o Chile em outubro. Estou disposto a ir a qualquer lugar que meu amigo chileno que me hospedará quiser me levar. Estou até disposto a experimentar novas comidas sem medo. Vocês não tem noção de como eu sou fresco com comida. Eu nunca me sujeito a pratos diferentes dos que estou acostumado, mas agora uma das coisas que mais estou ansioso é para provar tudo que a culinária chilena tem a me oferecer.
Eu duvido que esse pensamento positivo em relação a isso ocorresse se não fosse por Sora Yori. Eu sempre fui uma pessoa muito metódica, fazia tudo do mesmo jeito e não me permitia mudar isso. Um enorme comodismo. Meus amigos do trabalho até me zoavam quanto a isso, porque eles queriam fazer outra rota a pé em direção à estação de trem e eu falava "não, a gente tem que fazer ESSA AQUI", que era a que eu estava acostumado a fazer todo santo dia.
Assim que terminei de assistir o último episódio, tudo o que me vinha à mente, em meio às lágrimas de felicidade, era que eu queria mudar esse meu hábito. Queria deixar de ficar atrelado a essas barreiras mentais que me impediam de fazer algo simples como experimentar uma rota a pé diferente em direção ao trabalho. Agora posso dizer com toda certeza do mundo que essas barreiras estão sendo destroçadas.
Mas em relação ao que falei sobre viagem, é com esse tipo de coisa que quero investir meu dinheiro do trabalho. Novas experiências que agreguem à minha pessoa. Assim como falei no meu texto anterior sobre esse anime, eu comprei um teclado e estou aprendendo a tocar. Esse é o meu primeiro contato com música. Enquanto muitos começam a tocar algum instrumento quando criança, cá estou eu com 22 anos desbravando um território do qual não tinha o menor conhecimento, quase como se estivesse aprendendo uma nova língua.
Sabe, eu sempre tive esse sonho de ser músico. Desde moleque eu fico me imaginando tocando as músicas que gosto, especialmente de vídeo-game e anime, para grandes plateias. Sempre quis fazer meus medleys desse tipo de música e postar no YouTube, assim como muitos fazem. Assim que estiver dominando o teclado, também quero aprender outros instrumentos, como saxofone e baixo, algo que certamente farei no futuro. Posso dizer que finalmente estou me movendo em direção a esse sonho, guiado também por outras obras especialíssimas para mim, como K-ON! e Hibike! Euphonium, por seu conteúdo relacionado a música, e claro, por Sussurros do Coração (meu review), minha inspiração de vida definitiva.
Nada é um empecilho se você tem força de vontade e verdadeiras fontes de inspiração. Não existe essa de "já passei da idade de aprender algo novo". Eu tenho uma amiga cuja mãe começou uma faculdade nova de artes visuais aos 50 anos, uma área completamente diferente da que ela trabalhou durante toda a vida. Claro que dinheiro faz toda a diferença, mas o passo mais importante é deixar de lado esses pensamentos subterfugiosos que impõem uma barreira inexistente em si próprio.
Eu não sou mais um adolescente como a Mari, mas ainda sou jovem e sinto que preciso aproveitar minha juventude enquanto posso. Não dá para saber o dia de amanhã, eu posso ficar desempregado a qualquer momento. Por isso quero investir meu dinheiro em experiências pessoais enquanto ainda tenho a oportunidade, especialmente pelo fato de eu ainda não ter de lidar com tantas despesas.
Sora Yori mo Tooi Basho – e sua diretora Atsuko Ishizuka, seu roteirista Jukki Hanada, toda a sua equipe artística e as grandes estrelas do show: Shirase, Mari, Hinata e Yuzuki – me fez mudar esse pensamento, referente aos meus anseios, de "um dia farei isso" para "agora farei isso". Os passos que as garotas deram em direção à Antártida, ou melhor, ao seu futuro, estão incorporados nos passos que eu estou dando em direção ao meu futuro.
Você pode perceber que eu utilizei "é" ao invés de "foi" para descrever o anime como uma experiência alguns parágrafos atrás, pois não é algo passageiro – ele se tornou algo intrínseco da minha identidade. A jornada interior que proporciona ocorre constantemente dentro de mim e agora vai se manifestar em uma jornada exterior em direção ao Chile, à música e a muitas outras experiências.
"Quando saímos em uma jornada, há coisas que percebemos pela primeira vez. Que não há nada que possa substituir essa paisagem. Que as pessoas mudam, o mundo muda, mesmo que você não esteja vendo. Que não existe um dia que seja vazio. Que a sua casa tem um cheiro próprio. Se quiser perceber isso, precisa começar a se mover. Vamos nos manter em movimento até vermos uma paisagem que não conhecemos. Não importa o quão longe vá, o mundo é tão grande... Com certeza encontrará algo novo. Dá um pouco de medo, mas com certeza vai conseguir. Afinal, pessoas que sentem a mesma coisa logo perceberão isso também!"
CONCLUSÃO
Não é sempre que se decide acompanhar uma animação semanalmente, desde sua estreia, e imagina que essa se tornará uma de suas favoritas. Após seu término, posso dizer com todas as palavras que acho improvável que qualquer anime lançado esse ano supere Sora Yori mo Tooi Basho. Na realidade, para mim ele vai além de uma mera classificação como "Melhor anime da temporada" ou "Melhor anime de 2018".
Títulos não são capazes de fazer jus à experiência intrínseca que me proporcionou. Uma nota 10 não é o suficiente para dizer o quão importante essa obra é para mim enquanto pessoa. Nenhuma conclusão em palavras pode ser tida em relação a esse anime. É algo que apenas pode ser sentido, vivenciado, pois é com ele em meu coração que seguirei em frente em minha jornada.
-por Vinicius "vini64" Pires
Talvez você se interesse por minhas análises de animações similares a essa:
- Marco (Isao Takahata, 1976)
- Anne of Green Gables (Isao Takahata, 1979)
- Little Women II: Jo's Boys (Kozo Kuzuha, 1993)
- Sussurros do Coração (Yoshifumi Kondo, 1995)
- K-ON! (Naoko Yamada, 2009)
- Yama no Susume (Yuusuke Yamamoto, 2013)