domingo, 8 de outubro de 2017

Chuunibyou demo Koi ga Shitai!


Inspirado em meus amigos desenhistas que usam o mês de outubro para desafiar a si próprios a postar um desenho diariamente, o famoso inktober, pensei em fazer algo similar, mas semanalmente e com textos. Decidi apelidar essa atividade de writetober........pqp, que nome ruim. Mas enfim! Serão quatro artigos postados ao longo do mês, o primeiro dos quais é sobre um anime que mostra como eu fui me abrindo cada vez mais a esse tipo de entretenimento ao longo dos anos, o que pode ser uma coisa horrível se parar pra pensar, mas calma que eu ainda sei me policiar.

Esses tempos eu decidi assistir a uma animação do famoso estúdio Kyoto Animation, chamada Chuunibyou demo Koi ga Shitai!, de 2012. O estúdio é conhecido por seus diversos animes com personagens fofas e temáticas mundanas (o gênero slice of life) com leves twists de fantasia e mistério. Esse é o primeiro trabalho que assisti deles. Será que foi uma boa escolha?


PERSONAGENS

Antes de tudo, acho que preciso explicar que diabos significa o título do anime. A expressão “chuunibyou” pode ser traduzida como “síndrome da oitava série" e se refere aos adolescentes que acreditam ter poderes ocultos e que agem como se fossem um personagem de jogo ou desenho. Se isso já não bastasse, eles acreditam nisso como se fosse sua realidade.

Um caso crítico dessa síndrome pode ser encontrado na Rikka Takanashi, a portadora do Jaoshingan (Olho Tirano), um olho onipotente capaz de distorcer a realidade e desferir os mais devastadores poderes……mas, na verdade, é apenas seu olho esquerdo com uma lente de contato amarela e um tapa-olho.


Em sua busca pelo Horizonte Imaterial, um portal que a levaria a outra dimensão, ela acaba conhecendo Yuuta Togashi, um garoto da sua mesma classe do 1º ano do ensino médio, que antigamente era conhecido como......Dark Flame Master. Só de ouvir esse nome o rapaz já se contorce todo de vergonha, pois era o personagem que vivia quando sofria de chuunibyou, mas para Rikka esse nome faz seus olhos ficarem marejados de emoção. Enquanto Yuuta deseja obliterar isso das suas memórias, a garota quer reviver o “mestre negro das chamas”, então os dois começam uma relação conturbada que aos poucos se desenvolve em um romance desprovido de qualquer normalidade.


Yuuta não é o único assombrado por suas memórias de chuunibyou – esse também é o caso da Shinka Nibutani, a garota mais bonita de sua classe. Assim como o seu colega, tudo o que ela quer é ser uma garota comum no colegial, criar uma boa imagem sua e se tornar popular. Porém, há poucos anos atrás, ela era conhecida como Mori Summer (Verão Florestal), uma maga de coração puro capaz de se comunicar com fadas que viveu por mais de quatro séculos.


Ninguém sequer imaginava que uma garota como ela pudesse ter sofrido da síndrome da oitava-série......até entrar em cena uma estudante DE FATO da oitava-série, Sanae Dekomori. Ela se considera uma serva da Rikka, a quem sempre se refere como Mestra, e tem como inspiração a Mori Summer. Ao ouvi-la replicando todos os discursos que a maga postava em seu blog, Nibutani até rola no chão de tanta vergonha. Isso leva a Dekomori a apelidá-la de falsa Mori Summer, com quem dá início a uma relação na qual sempre estão querendo arrancar o cabelo uma da outra.

Sempre abro um sorrisão no rosto com essas duas.

A fim de encontrar novos membros para buscar o Horizonte Imaterial, Rikka decide criar um clube no colégio, a Sociedade Oriental de Magia, mas ninguém se interessa. No entanto, uma garota também estava com dificuldades em encontrar pessoas para participar de sua sociedade cuja finalidade seria....cochilar. Essa é a Kumin Tsuyuri, estudante do segundo ano cujo maior passatempo é dormir. Ao unir forças com a Rikka e fundar a Sociedade Oriental de Magia e Cochilo (que depois se torna a Sociedade Oriental de Magia e Cochilo de Verão com a participação da Mori Summer), ela conhece todas essas figuras que apresentei e, para o descontentamento do Yuuta e da Nibutani, fica fascinada com o universo criado em suas mentes graças à chuunibyou.


Na segunda temporada é introduzida a Satone Shichimiya, uma garota mágica que atende pelo nome de Sophia Ring SP Saturn VII.....é, já dá pra perceber que ela também sofre de chuunibyou, mas essa é um caso especial, pois foi quem despertou a síndrome no Yuuta durante o ensino fundamental. Os dois tinham uma certa intimidade na época, então quando ela volta mantendo os hábitos antigos, surge um novo impasse na relação do garoto com a Rikka.


A maior inimiga do universo de Rikka é a sua própria irmã, Touka Takanashi, a quem ela se refere como A Sacerdotisa. O motivo de ser considerada uma oponente é pelo fato de odiar a maneira como Rikka age em virtude da síndrome, então sempre tenta cortar as asinhas dela quando começa com os papos de Jaoshingan e Horizonte Imaterial, até porque esse segundo item tem um significado um tanto triste... Porém, é irônico como ela compactua de certa forma com sua irmã ao usar uma concha de cozinha para lutar contra ela.


Quando entrou na escola, a primeira pessoa que recepcionou o Yuuta foi o Makoto Isshiki, um rapaz cujo único objetivo de vida aparente é ser popular entre as garotas. Ele é tão fissurado na causa que chegou a fazer um ranking das mais bonitas da classe. O problema é que o rapaz só sabe observar e é completamente inseguro de si mesmo, não consegue dar sequer um oi para uma menina. Ao conhecer a Kumin, sua ingenuidade e simpatia conquistam seu coração e ele começa a tentar investir na dorminhoca, surtindo resultados cômicos.

Isshiki dando uma de JoJo.

Acho que a única pessoa realmente sã de todos esses que mencionei é a irmã do Yuuta, Kuzuha Togashi. Ela é uma garotinha responsável que estuda, cozinha e faz as tarefas de casa, ou seja, vive uma vida normal, mesmo com tantos loucos em sua volta. O que eu mais gosto na personagem é o jeito como ela ignora completamente a maneira errática que aqueles com chuunibyou agem e conversa com eles como se fossem “pessoas normais”. Fiquei feliz com o tanto que ela aparece na segunda temporada, já que na primeira recebe pouquíssimo destaque.


Esses dias eu estava assistindo a um anime com elementos parecidos (romance, ensino médio, comédia, adolescentes etc), mas não estava curtindo tanto. Foi aí que percebi a grande sacada de Chuunibyou, o diferencial em relação aos diversos animes de comédia com romance colegial – a maneira como a síndrome torna os personagens únicos. Convenhamos, a maioria dos adolescentes dessa geração são chatos e previsíveis, só querem saber de namorar e ter uma vida social comum. Uma animação com personagens assim não me atrai (eu sou fã de realismo em animações, mas não é pra tanto também, né).

Agora se você adiciona à equação essa síndrome à vida mundana de adolescentes, as situações ficam muito mais interessantes. Um simples romance se torna singular, devido à inabilidade da garota de lidar devidamente com a realidade. Uma relação de amor e ódio entre duas meninas em que uma acusa a outra de ser uma maga falsa só pode existir graças à síndrome. O sonho de uma moça de criar um "clube do cochilo" só pode ser realizado porque seus maiores amigos sofrem ou sofreram de chuunibyou... O maior mérito dessa série certamente é a fantástica interação entre os personagens.


Não há dúvidas de que um slice of life é mais impactante quando ele remete fielmente à vida real, como é o caso de diversos dos animes do World Masterpiece Theater que eu escrevi sobre aqui no blog, mas isso não invalida a existência destes que tomam algumas liberdades comédicas como é o caso de Chuunibyou, o qual mesmo assim não foge muito de uma realidade aceitável da vida no ensino médio. O foco principal é no lazer e no romance que os jovens procuram durante essa fase de suas vidas cuja maior preocupação deveria ser os estudos.

Eu li muitas críticas negativas sobre a segunda temporada, nas quais a maioria reclama da ausência de história. Parece que o pessoal não percebe que o anime em questão é do gênero slice of life, então não há necessidade de criar novamente um drama que gire o enredo como foi na primeira temporada. O foco aqui é o desenvolvimento do romance Yuuta & Rikka e as situações que vivem diariamente, sozinhos e juntos de suas amizades. A relação da Dekomori com a Nibutani também é explorada e expandida consideravelmente, com um episódio lindo que mostra a importância de uma para a outra. Poxa, essa temporada tem até uma competição de cochilo da Sociedade Oriental de Magia e Cochilo de Verão contra um clube de outra escola! Não tem como não amar isso!

Graças a essa temporada pudemos rir por mais 13 episódios com esse grupo
e as mais variadas situações.

Muitos ainda reclamam da lentidão com que o relacionamento do Yuuta com a Rikka progride, querendo que eles se beijem logo, mas todos que desejam isso falham em compreender estes personagens, pois não são um casal comum daqueles que você encontra todo dia na rua. O chuunibyou da menina é uma forte barreira entre os dois, que a impede de se expressar adequadamente, mas mesmo assim o Yuuta não tenta forçar ou apressar as coisas, diferente do que muitos “caras normais” fariam, pois ele a ama e compreende as dificuldades dela.

"Mesmo que seja lentamente, de pouquinho em pouquinho,
algo grande está surgindo entre nós".

ESTILO

Chuunibyou faz parte de uma denominação de animes que se popularizou muito a partir dos anos 2000, chamada moe. Um dos significados desse termo é o de criar afeição a um personagem de anime ou jogo num sentido romântico, que não é o meu caso, mas também pode ser usado para descrever um anime com enfoque em personagens fofas fazendo coisas fofas, algo que essa série tem aos montes, especialmente no que se refere à Rikka, Dekomori e Kumin. Eu não reclamo, pois personagens femininas geralmente são minhas favoritas e adoro coisas fofas, então é o “melhor dos dois mundos”.


O trabalho de animação não deixa a desejar – os personagens são genuinamente expressivos, seja em seus movimentos quanto em suas expressões faciais. Eu fiquei impressionado em como o estúdio dá atenção até para os mínimos detalhes, como por exemplo em uma cena em que a Dekomori lacrimeja levemente ao ponto de quase não ser possível ver a lágrimas, aí no plano seguinte, em que a personagem não é nem o foco da atenção, ela enxuga cada um de seus olhos delicadamente. Adoro esse tipo de preciosismo, isso só agrega na sua imersão com a obra.

A animação durante as seções fantasiosas de lutas são um show a parte, coreografadas de um jeito que deixa muito anime shounen no chão. Mas o que mais me cativa nesses segmentos é a maneira como eles acabam. Tá rolando explosões, luzes e destruição pra tudo quanto é lado, aí quando o golpe final vai ser desferido, um corte seco mostra duas garotas brincando no chão. As vezes a edição até alterna entre realidade e fantasia rapidamente, o que sempre produz um resultado engraçado de se ver.


Um elemento muito presente nos animes da atualidade é o famigerado fanservice, ou seja, quando exploram as personagens femininas de maneira fortemente sexualizada. Esse é um dos principais motivos por eu ter desviado por tanto tempo de animes modernos, mas, felizmente, Chuunibyou é bem sutil quanto a isso, se comparado com outras produções similares. O estúdio deixou pra abusar disso nos encerramentos e nas artes promocionais, porque, querendo ou não, isso atrai público, mesmo que seja pelos motivos errados.

O máximo que a série mostra são decotes, pernas em evidência e as cenas de praia com biquínis que se tornaram obrigatórias de uns tempos pra cá, mas nunca chega a ter nada apelativo como planos que mostrem calcinhas e as garotas em situações embaraçosas como se vê em muito anime por aí. Só tem um único momento, na segunda temporada, em que eles forçaram a barra nesse sentido em uma cena na praia (tinha que ser, né) com a Dekomori que me deixou puto ao ponto de eu cogitar parar de assistir. Ainda mais com ela que é a minha personagem favorita!

"Não se atreva a me desenhar desse jeito de novo, DEATH!"

ÁUDIO

A trilha sonora da série me agradou ao ponto de eu procurá-la após terminar de assisti-la e devo dizer que não é tudo que assisto que tem esse privilégio, hein. 60% das músicas são alegres e alto astral, variando entre peças agitadas (momentos mais comédicos e descontráidos) e calmas (trechos de romance e intimidade); 30% são épicas, usadas nas seções de ação que se passam na imaginação chuunibiyou-ística; e os outros 10% são músicas tristes para os momentos mais dramáticos.

                           


Pra variar, também adorei as temas de abertura e encerramento. As aberturas são um pop eletrônico que me remetem aos remixes de músicas de jogo que eram muito comuns na década passada. A da segunda temporada até incorpora uma orquestra em alguns trechos para dar um ar de grandiosidade que, apesar de não combinar muito com o conteúdo da série, me agrada bastante. Já o gênero dos encerramentos é rock pesado, com as dubladoras das garotas cantando as músicas.

                               

E falando nisso, esse é um ponto que preciso elogiar – a dublagem (japonesa, só pra não confundirem), em especial das meninas principais. O trabalho dos dubladores também é ótimo, seja o do Yuuta quando ele incorpora o Dark Flame Master ou o do Isshiki e seu sotaque do interior, mas o das garotas é o que mais se destaca. Os grunhidos da Rikka quando se machuca, a voz fofíssima da Kumin, as reações de vergonha da Nibutani ao lembrar de seu passado e o ênfase que a Dekomori coloca quando fala “desu” para parecer que está dizendo “DEATH!”...

Para finalizar a seção, preciso compartilhar o encerramento dos especiais da segunda temporada, com direito a uma música carnavalesca contagiante e overdose de fofura na animação da Rikka chibi dançando.

                              

IDENTIDADE INTERIOR

Voltando ao título, o nome em inglês é Love, Chuunibyou and Other Delusions e este descreve com excelência o conteúdo da série, visto que os temas principais são romance, a síndrome que os personagens sofrem e as desilusões que provêm desses dois elementos. Por se envergonhar do seu passado com chuunibyou, Yuuta faz de tudo para se esquecer disso e se tornar um garoto comum, o que prova ser uma tarefa difícil quando Rikka entra em sua vida. Ainda assim, depois que começa um relacionamento com ela, tenta mostrá-la o “jeito certo” de se viver, sem loucuras e brincadeiras, apenas maturidade e normalidade.

- Bonito, não é mesmo?
- São apenas carros. O reflexo de seus faróis.

Com a imaginação, é possível transformar o mundano em mágico, mas isso se perde quando
só se tem olhos para a objetividade da vida comum.

Porém, nessa busca incessante pelo ordinário, você acaba abrido mão da individualidade, daquilo que te torna único. Ao ver como Rikka estava se habituando forçadamente a agir normalmente, infeliz, Yuuta se dá conta disso. Existem tantas pessoas iguais no mundo, não há motivos para querer se tornar “só mais um”. Claro que na vida real você não pode agir como se fosse um “mensageiro das trevas” ou algo do tipo, mas a mensagem da série é – se você se sente diferente dos outros, abrace essa diferença. Não tente forçar ser quem você não é.

CONCLUSÃO

Frequentemente eu me pego reassistindo algumas cenas no YouTube, que ainda me divertem bastante. Isso é o que importa. Chuunibyou pode não ser uma animação inspiradora que mudou minha vida, mas as histórias cômicas desses personagens certamente me proporcionaram muita felicidade e não há nada que faça um bem maior a uma pessoa do que ser feliz.




-por Vinicius "vini64" Pires

Leia também minhas outras análises sobre animes da Kyoto Animation:

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