sábado, 27 de outubro de 2018

31 Minutos


Uma boa parcela da infância de nós da geração Z se passou diante de uma televisão. Os programas Bom Dia Companhia, TV Globinho e a programação inteira da TV Cultura eram pratos cheios para as crianças. Nos canais pagos, tínhamos o Cartoon Network, a Nickelodeon e a Fox Kids. Eu era uma criança desprovida de cultura, pois raramente chegava perto da TV Cultura, inclusive nunca gostei de Castelo Ratimbum. Também assistia pouco a Globo e o SBT, pois meus pais pagavam TV a cabo.

Meus amigos sabem como eu adoro me tornar fã assíduo de algo – meu texto recente sobre Super Mario é um exemplo, assim como a minha adoração pelo estúdio Kyoto Animation do qual venho escrevendo textos sobre todos os seus trabalhos desde o ano passado. Essa minha mentalidade pode ser traçada desde a infância, pois o canal que eu amava assistir era a Nickelodeon. Também assistia um pouco ao Cartoon, mas ao acordar ou chegar da escola, eu ligava a TV direto na Nick.


Tenho memórias vivas de diversos de seus desenhos de tanto que os assistia, como Os Castores Pirados, Hey Arnold, Rocket Power, Jimmy Neutron, Danny Phantom e, claro, Bob Esponja. Quem não amava o Calça Quadrada, né? Eu decorei o nome de quase todos os episódios das quatro primeiras temporadas de tanto que assistia. Às vezes eu ficava com vontade de assistir a um determinado episódio e rezava para que o exibissem. O meu favorito era aquele da banda. Só de lembrar da música que tocam me dá calafrios.


Mas todos esses programas ficaram na infância, não continuei os assistindo ou lembrando com frequência deles depois de crescido. Acredito que seja algo comum entre todos nós. Crescemos e deixamos os desenhos da infância para trás. Mas existe um programa que se tornou uma exceção a essa regra. Um que nunca deixei de gostar e consumir conteúdo ao longo dos anos. Me refiro ao noticiário de maior credibilidade da televisão chilena, 31 Minutos!

Exibido na Nickelodeon entre 2004 e 2006, esse era o meu programa favorito da infância, disparado. Conforme supracitado, 31 Minutos é uma produção chilena sobre um jornal televisivo bem humorado apresentado por fantoches. Como eu tinha entre 8 e 10 anos quando assisti pela primeira vez, é difícil de lembrar o que me deixou tão cativado pelo programa, mas é possível que tenha sido o quão único ele era em relação ao que passava no canal.


Tudo exibido na Nick eram desenhos e séries live-action tipo Kenan & Kel e Zoey 101, aí de repente começam a exibir um noticiário apresentado por diversos fantoches que conta com uma parada musical ao fim de cada episódio. Isso certamente chamou a minha atenção. Mas por que a obra se destacou entre as demais que assistia na infância e manteve o meu interesse ao longo dos anos? Vamos então aos motivos de 31 Minutos ser tão especial para mim, lembrando que isso não é exatamente uma análise, está mais para um relato afetivo.

Acho que posso afirmar com assertividade que o aspecto mais fascinante do programa são os seus fantoches e bonecos por conta da variedade insana de suas formas e cores. Não há uma uniformidade – temos um simples coelho vermelho, uma lata com olhos, uma forma humanoide com listras de zebra, uma boneca inflável, um rapaz desdentado com o chapéu do Chaves e uma variedade infindável de tudo que você puder imaginar.

Olhando com um olhar atual, fica evidente que a produção começou com um orçamento baixo, então eles criavam o que conseguiam com os poucos recursos disponíveis e devo dizer que isso dá um grande charme à obra, sem contar a criatividade enorme da equipe. Mesmo posteriormente com mais recursos eles não perderam a inventividade e continuaram criando personagens com os materiais mais simples possíveis.


Além de suas aparências únicas, o que tornava 31 Minutos tão agradável e divertido de se assistir era o carisma dos personagens. O apresentador Túlio Trivinho é um cara egocêntrico e narcisista que acha que o mundo gira em torno de si, mas que na real ninguém leva ele a sério; o Juan Carlos Bodoque é um coelho de voz charmosa que aparenta seriedade com suas matérias ecológicas, mas que se desespera facilmente com apostas em cavalos; o Policarpo Avendanho é um crítico de espetáculos que fala "top top top top top top" toda vez que dá um chilique; o Juanin Juan Harry é o humilde assistente de palco com voz arrastada que adora falar "estamos no ar!!"; o Joe Pino é um bicho que adora opinar incessantemente a respeito de todo e qualquer tema ao ponto das pessoas o deixarem falando sozinho... A lista de personagens é gigantesca, não tem como mencionar todos.



Conforme mencionei anteriormente, o programa simula um noticiário, mas falha miseravelmente em ser um de credibilidade com o tanto de problemas que acontecem no estúdio, com suas matérias de temas aleatórios, seus funcionários pouco profissionais e entrevistados sem nenhuma relevância no mundo artístico. Mas claro, ninguém quer assistir um Jornal Nacional apresentado por fantoches, então a graça está em todos estes elementos.

Como o público alvo da obra são crianças, há muito conteúdo infantil, mas eu diria que é algo para todas as idades. Existem diversas referências e piadas com duplo sentido que eu apenas entendi quando assisti crescido, especialmente na 4ª temporada que abrange um público maior por ter sido exibida em horário nobre na televisão chilena, mas trarei mais detalhes a respeito disso posteriormente.

Quando era criança eu não percebi que a Sakura Kinomoto fazia um cameo em uma das enquetes do Mico, o Micofone!

O único quadro do programa com um peso realmente educativo são as matérias ecológicas do Juan Carlos Bodoque, em que ele visita diversos locais do Chile e aborda temas ambientais e históricos variados, como reciclagem, incêndios florestais, civilizações antigas, efeito estufa, museus e muito mais. É um verdadeiro passeio por todo o território chileno e por sua vasta cultura.

Outro quadro com um certo teor educativo é o do Super Meia Man, o super-herói do programa, uma meia com óculos de natação. Ele defende os direitos infantis e combate qualquer tipo de intolerância. Era um dos personagens mais populares aqui no Brasil, lembro até de ter adicionado um perfil fake do personagem no Orkut com quem eu conversava.

Bodoque em uma matéria sobre espécies em extinção.

"Esse é um trabalho para o Super Meia Man! O dever me chama!"

Mas o que eu mais amava em 31 Minutos e um de seus aspectos mais singulares era a parada musical ao fim de cada episódio. Na época eu curtia bastante assistir a MTV e os tops que eles exibiam, então ter isso no meu programa favorito era um baita diferencial. As canções grudavam igual chiclete na cabeça e contavam com clipes que as tornavam mais divertidas de se assistir, cada temporada com o seu set de músicas diferentes.

Em cada episódio eu ficava na expectativa de qual música ficaria no topo da parada, pois apenas essa tinha seu clipe exibido por completo. Às vezes eu torcia para que determinada canção ficasse em primeiro. A minha favorita da 1ª temporada certamente era Yo Opino, do Joe Pino, personagem que mencionei anteriormente. Eu adorava tanto a ele e a música que usei ambos na minha série machinima Super Metal Mario em 2008, a qual menciono nesse texto. Ele acabou se tornando um personagem fixo e um dos mais adorados da obra, tanto que dei mais destaque a ele na temporada final, na qual eu até mesmo o dublei.

                         

Eu nunca parei de escutar as canções. Até hoje as escuto com certa frequência. Depois que a série parou de ser exibida no Brasil, demorou até que as músicas reaparecessem em português na internet, então eu passei a escutá-las em espanhol mesmo. Devo dizer que me acostumei tanto às versões originais que nunca mais escutei as em português. Sei cantar diversas delas inteiramente, inclusive.

Isso se tornou a característica mais icônica de 31 Minutos, tanto que nessa década eles começaram a fazer shows no Chile e no México em que tocam essas músicas ao vivo, com direito a apresentações de fantoches e tudo mais. Eu pretendo visitar o Chile em breve, mas deixarei para o fazer quando tiver a oportunidade de assistir um desses shows, pois é um verdadeiro sonho que tenho.

                         

Das quatro temporadas do programa, apenas as duas primeiras foram exibidas no Brasil, apesar das posteriores terem sido dubladas essa década, mas nunca exibidas. Conforme disse, eu nunca deixei de me interessar por 31 Minutos, então assisti a ambas as temporadas em espanhol mesmo, apesar de saber pouquíssimo da língua. Dava para me divertir da mesma forma e isso me familiarizou mais ainda aos personagens e a todo o universo da obra. A 3ª temporada talvez tenha a melhor seleção de canções de todas, muitas delas estariam nas primeiras colocações da minha Parada Top.

                         

A 4ª temporada é um caso especial, pois foi exibida em 2014, nove anos depois da anterior, então fiquei legitimamente empolgado com a notícia de que o programa voltaria depois de quase uma década. Acompanhei o lançamento dos episódios semanalmente e foi incrível. O salto de qualidade da produção foi enorme em relação às temporadas passadas, contou com diversas referências à cultura popular, uma nova safra de canções cativantes e um humor mais abrangente por ter sido exibida em horário nobre no principal canal de TV do Chile. O penúltimo episódio dessa temporada é possivelmente o meu favorito da série inteira, pois é uma paródia fantástica da cultura de blogs e Youtubers.

O famoso quadro "restaurado" de Jesus marcando presença.

Site tosquíssimo do Túlio, idêntico àqueles que encontrávamos no início da década anterior.

Até o Hannibal marca presença em uma das músicas

Em 2012, algo inusitado aconteceu. Depois de anos sem quaisquer notícias sobre 31 Minutos, o Brasil simplesmente decidiu dublar o filme da série, lançado em 2008 no Chile, e lançá-lo aqui. Até que se empenharam na divulgação, vi diversas propagandas e vídeos promocionais na internet. Tentaram atrair um público maior ao substituir o elenco original de dublagem por diversos "atores globais" como Márcio Garcia e Mariana Ximenes, uma decisão que não me agradou muito, apesar da dublagem ter ficado interessante, com adaptações que deram sotaques de gaúcho, carioca e nordestino a alguns personagens.

Claro que não poderia perder a chance de assistir isso nos cinemas. Sabe quantas pessoas tinham na sessão que fui? Incríveis sete pessoas, contando eu e minha mãe. Parece que a estratégia dos atores globais não deu muito certo...

                         

A dublagem brasileira (do programa, não do filme) foi feita pela Álamo e é um daqueles trabalhos que conta com diversos personagens sendo dublados pelos mesmos profissionais. Adoro esse tipo de abordagem, pois mostra a versatilidade desses talentosos dubladores. O elenco conta com nomes grandes como Wendel Bezerra (Goku, Bob Esponja), Alfredo Rollo (Vegeta) e Marcelo Pissardini (Lula Molusco, Hades de CdZ) e dá pra perceber como é um daqueles programas divertidíssimos de se dublar, pois eles tomaram a liberdade de fazer diversas adaptações, como transformar personagens específicos em referências óbvias ao Galvão Bueno e ao Gugu.

Mas a dificuldade de se encontrar conteúdo dublado do programa depois que ele deixou de ser exibido aqui não era algo exclusivo às músicas. Isso era dos males o menor, pois logo elas apareceram no YouTube. Já episódios completos até pouco tempo eram impossíveis de se encontrar. Durante toda a minha vida eu pesquisei em todo lugar por eles e apenas encontrei dois deles. O canal oficial chileno passou a disponibilizar episódios no YouTube no idioma original em 2014, então sempre ansiei pelo dia em que eles postariam episódios dublados em português.


Depois de muitos anos, em 2018, meu desejo finalmente se tornou realidade e o canal começou a publicar semanalmente alguns episódios em português. Disseram que não poderiam postar todos por questões legais, mas só o fato de finalmente poder reassistir 31 Minutos dublado depois de mais de uma década já é uma verdadeira dádiva. Eles até publicaram um episódio da 1ª temporada que eu tenho certeza que não foi exibido aqui!

Eu diria que é uma sensação um tanto extraordinária assistir isso semanalmente depois de tantos anos, algo impossível de descrever. Uma coisa é certa: o meu sorriso no rosto está lá durante todos os episódios, além de conseguir entender coisas e prestar atenção em detalhes que minha mente de criança não conseguia.




31 Minutos pode não ser um trabalho que teve grande influência em minha vida como os jogos de Mario e certos animes aos quais escrevi sobre aqui no blog, mas não há dúvidas de que é uma obra importante que continua relevante para mim mesmo depois de quase 15 anos. Poucos trabalhos conseguem essa façanha. Um programa que consegue te colocar um sorriso no rosto só de pensar a seu respeito certamente é algo demasiadamente especial.


-por Vinicius "vini64" Pires
Comentários
1 Comentários

Um comentário:

Anônimo disse...

Lançou a temporada 4 de 31minutos na netflix em português