sexta-feira, 13 de abril de 2018

Lucky Star


Você se lembra do Orkut e do YouTube entre 2007 e 2012? Durante essa época os animes estavam bombando pra valer no Brasil, com diversas comunidades no Orkut e blogs sobre a cultura otaku, convenções começando a aparecer nas maiores cidades e vídeo-montagens que uniam jogos a animes estavam por todo o YouTube. Nessas comunidades e vídeos, era facílimo de se deparar com um anime em particular que era o símbolo dos otakus da época.

Sim, cá estou eu, em pleno 2018, escrevendo sobre Lucky Star, uma década depois de seu lançamento. Hoje em dia você não vê uma alma viva falando dele, mas seu sucesso na internet foi estrondoso. Imagino que muita gente daquela época tenha sido introduzida aos animes por meio desse. Grande parte do seu sucesso se deve ao fato de que seu conteúdo era inusitado para a época e retratava a vida de pessoas normais vivendo suas vidas normalmente, um estilo de anime que viria a se consagrar como "slice of life". Mas Lucky Star era ainda mais fácil de se identificar com o público da internet por fazer inúmeras referências à cultura otaku e contar com personagens que representam fielmente o seu público.


PERSONAGENS

Assim como na outra série puramente de comédia da KyoAni, Nichijou (meu review), Lucky Star conta com um extenso elenco de personagens divertidos e carismáticos das mais diversas personalidades. Não teve sequer um deles que eu tenha desgostado. Todos conseguiram constantemente colocar um sorriso no meu rosto, então preciso listar cada um deles aqui.

A face principal de Lucky Star é uma que você, se é fã de qualquer coisa relacionada à cultura nerd e usava a internet no final da década passada e início dos anos 2010, certamente conhece. Estou falando da Konata Izumi, a melhor representação de um otaku obstinado por animes, mangás e games que já existiu na mídia. Só sabe jogar o dia inteiro, age com negligência aos estudos e é deveras preguiçosa.

Representação mais fiel a um adolescente fã dessas coisas não existe.

A melhor amiga da Konata é a Kagami Hiiragi. Diferente de sua colega desleixada, Kagami é diligente e estudiosa. Também curte games e mangás, mas não é tão aficionada e sabe quando deixá-los de lado para estudar. Entretanto, sua maior característica é o seu temperamento curto. Não há ninguém que se estresse tanto como ela com as piadinhas e com a personalidade da Konata. Ela gosta de se fazer de difícil, como se não se importasse muito com as coisas, mas é só fachada. E é um tanto fácil de deixá-la constrangida.

Uma legítima tsundere.

Ela tem uma irmã gêmea chamada Tsukasa, uma garotinha fofa, calma e preguiçosa, o completo oposto da Kagami. Ela é avoada e não se dá muito bem com os estudos, apesar de tentar se esforçar. Diferente das outras duas que mencionei, ela não entende nada sobre jogos e animes, mas sabe se divertir com pouco, como assistindo programas de TV ou escrevendo mensagens desnecessárias no seu celular.


Junto delas sempre está a Miyuki Takara, a mais inteligente da turma, uma donzela que também não manja nada sobre tecnologia e cultura otaku, mas entende sobre qualquer outro assunto, então perguntam de tudo para ela. Carismática e prestativa, ela responde sempre com um sorriso no rosto. Uma característica marcante sua é seu corpo "evoluído" que causa uma certa inveja na Konata, e também sente pavor de dentistas.


A família da Konata marca presença forte na série. Seu pai, Soujirou Izumi, é um homem safado que é obcecado por garotas do ensino médio e fica tirando foto dessas em seu tempo livre. Ele se casou com sua esposa, já falecida, por ela se parecer uma garotinha devido à sua altura e corpo subdesenvolvido. Ele é viciado em games assim como sua filha e gosta de jogar simuladores de relacionamento.

Soujirou e sua esposa Kanata.

A prima da Konata, Yui Narumi, é uma policial que não parece nem um pouco uma, pois é desleixada, pouco inteligente, alcoólatra e adora dirigir em alta velocidade, mas ainda assim é uma pessoa muito querida. Ela tem uma irmã mais nova, Yutaka Kobayakawa, que passa a viver na casa da família Izumi. Essa garotinha, que esbanja fofura, é tão pequena que nem parece estar no 1º ano. Ela fica doente com facilidade e é muito ingênua, nunca percebendo o que acontece ao seu redor.

Yutaka, Yui e Konata.

Yui por trás do volante, estilo Initial D.

A Yutaka estuda na mesma escola que a Konata e as outras garotas. Sua melhor amiga é a Minami Iwasaki, uma garota alta e extremamente tímida que faz de tudo para que sua "comissão de frente" aumente, já que é uma tábua. Na classe delas também se encontra a Tamura Hiyori, uma garota que parece comum à primeira vista, mas na verdade é uma desenhista de mangás eróticos e as duas mocinhas que mencionei acima são uma fonte de inspiração para seus desenhos.

Minami e seu complexo.

Tamura, no fundo pensando em alguma perversidade.

A Konata, a Miyuki e a Tsukasa estudam na mesma classe, mas a Kagami fica isolada em outra sala. Contudo, ela tem duas outras amigas em sua turma, a Misao Kusakabe e a Ayano Minegishi. A primeira delas é uma garota extrovertida que passa o dia inteiro sorrindo e é um pouco relaxada. A segunda é uma moça educada cuja personalidade lembra bastante a Miyuki.


Para fechar o elenco de estudantes, temos a Patrícia Martin, apelidada de Patty por suas amigas, uma estudante americana que trabalha junto da Konata em um café de cosplay. Ela é fascinada pelo mundo otaku e acredita que a cultura do Japão se resume a isso, chegando ao ponto de rir de japonesas que não conhecem determinada curiosidade do país que é relacionada a um anime. Ela é basicamente aquilo que chamamos de weeabo.


Faltou falar só sobre a professora da turma da Konata, a Nanako Kuroi. Ela tem uma personalidade alegre e parece sempre falar com seus alunos em tom de deboche, especialmente com a Konata, com quem tem uma certa implicância devido à sua personalidade despreocupada. Por incrível que pareça, as duas são parceiras de games e jogam juntas um RPG online. Ela também é solteira com quase 30 anos de idade e não sabe lidar com esse fato devidamente.


Ao fim de cada episódio, nos é apresentado um bloco chamado Lucky Channel, uma espécie de bastidores da série. Ele é apresentado pela Akira Kogami, uma idol fofa, e pelo Minoru Shiraishi, um estudante comum. Pera aí, eu chamei a Akira de fofa? Não não, isso tá errado! Ela pode até parecer fofa, mas essa moça se irrita com uma facilidade absurda, e quando isso acontece, ela vira outra pessoa. Sua voz fina bonitinha se torna áspera como de uma adulta fumante. Quem mais sofre com sua personalidade agressiva é o pobre do Shiraishi, que apenas dá o seu melhor para ser um bom co-apresentador.


HUMOR

Lucky Star é um dos animes menos acessíveis que já assisti. Não é a toa que ele é criticado por muitos – é só olhar a página do anime no MyAnimeList e ver que suas análises mais relevantes são notas 2, 2 e 1 (de 10). O fato é que são necessários certos requerimentos para desfrutar do que a obra tem a oferecer, caso contrário a pessoa vai se aborrecer mais do que se divertir.

Para começar, você precisa gostar do gênero slice of life, porque mais "pedaço da vida" que essa série não existe. Ela é completamente parada no sentido de que nada acontece além das personagens vivendo suas vidas normalmente. Não há nenhum enredo maior, elas não enfrentam nenhum grande problema: é simplesmente o dia-a-dia de estudantes do ensino médio e seus parentes.



Isso é o que agrava o maior problema da obra para muitas pessoas – o humor se dá majoritariamente por conta de conversações entre as personagens. Pense nos diálogos mais banais, triviais, ordinários e comuns que se possa imaginar. Chega a ser absurdo pensar que existe uma animação centrada em conversações tão corriqueiras como essas. O primeiro episódio nos introduz de forma indefectível já nos seus primeiros minutos ao conteúdo que encontraremos com uma discussão das garotas sobre qual é o lado certo de se comer um doce de chocolate. Esse doce não existe aqui, mas daria para adaptar esse diálogo em uma discussão sobre começar a comer uma coxinha por baixo ou por cima.

"Eu nunca consegui matar um mosquito. Seria nojento ter sangue na sua mão ao matar um".

Outro aspecto crucial do humor de Lucky Star são as referências que faz ao mundo otaku, seja sobre animes – que vão desde a década de 60 até produções atuais (sério, tem menções aos animes do World Masterpiece Theater que eu tanto escrevo aqui no blog e provavelmente sou um dos únicos brasileiros que entenderei a referência) –, mangás, light novels e nomenclaturas dessa cultura (ex. Pai da Konata e sua filha enquadrando pessoas em estereótipos como tsundere e moe, Akira falando que é popular entre os lolicons). Tem até referências a séries ocidentais como Quem Quer Ser Um Milionário? e 24 Horas (sim, aquela do Jack Bauer) e a elementos da cultura da internet como games online e o MSN (saudades).

Is that a motherfucking JOJO REFERENCE?!?!

Não faltam referências a games também, como essa ao Excitebike de NES.

Alguns dos animes mais famosos referenciados incluem Yu-Gi-Oh, Dragon Ball, Initial D, Detective Conan, Fullmetal Alchemist, Kanon e mais diversos animes não tão conhecidos para o público ocidental. Mas o rei das referências é indubitavelmente The Melancholy of Haruhi Suzumiya (meu review). Ter assistido esse anime antes de Lucky Star não é obrigatório, mas certamente tornará a experiência mais divertida pela quantidade astronômica de referências que é feita, desde imagens, músicas, acontecimentos, falas e até mesmo aparições dos próprios personagens da série.

Kyon sensualizando.

A própria Haruhi faz uma aparição, com direito a fanservice! Fazendo jus à sua série...

Por sorte, eu me qualifico a todos esses requerimentos, então minha experiência foi 100% positiva. Esses diálogos comuns às vezes são TÃO comuns que eu começava a rir, tipo uma conversa de 1 minuto sobre como é difícil de dormir no calor. Quanto às referências, eu não entendia uma boa parcela delas, mas a maneira com que são apresentadas as tornam cômicas mesmo sem entender.

Apesar de eu ter dito que o conteúdo da série é parado, o mesmo não pode ser dito para o seu ritmo. Cada cena não se estende muito em sua duração, com poucas que duram mais de 3 minutos e algumas tão rápidas quanto 15 segundos. Isso impede que você se sinta entediado se não está gostando de um segmento, porque é feita uma piada aí já pula rapidamente para a próxima.

Não gostou dessa cena de 1 minuto da Yutaka tentando fechar um pote?

Então talvez você goste dessa da Konata transferindo arquivos no computador.

A edição também sabe ser frenética e inventiva quando quer, como na cena em que o pai da Konata prepara um miojo com diversos cortes em menos de 2 segundos, na cena que mostra o dia-a-dia das irmãs Hiiragi com a tela dividida para cada uma delas e em uma cena com a prima Yui e as amigas da Yutaka que repete o mesmo momento de dois pontos de vista diferentes.

A cena do dia-a-dia das irmãs Hiiragi que mencionei.

Também é feito um bom proveito de outros artifícios de edição, como texto em tela. Não é sempre que você lê "roflcopter" numa animação.

Mais um aspecto positivo da execução é a quebra de expectativa. Em determinadas cenas, você espera que algo aconteça, mas o desfecho é inesperado. Um exemplo disso é a cena em que a Tsukasa coloca uma concha no ouvido e começa a refletir sobre a própria vida ao som relaxante das ondas, até que um inseto sai de dentro da concha e corta o clima.

Outro exemplo bom é quando a Kagami fica feliz por ter conseguido capturar um peixe num festival. Isso é tratado como um momento emotivo, com uma música sentimental e a garota sob um fundo preto, mas antes que possamos absorver esse momento, a cena é abruptamente cortada para outra. Isso é algo que adoro, a maneira como eles unem o ordinário ao aleatório.

Uma conversa normal entre amigas, mas uma delas está parada com um sorvete na boca. Por que? Vai saber...

Por mais que a grande maioria dos momentos da série sejam de comédia, existem alguns sentimentais. Nós passamos tanto tempo acompanhando as mais variadas trivialidades da vida desses personagens que ficamos familiarizados com eles, então ocasiões assim acabam sendo genuinamente tocantes, nem que seja só um sentimento de "owwnn". Não é nada ao nível de K-ON! (meu review) que te deixa desidratado de tanto chorar, mas é algo que aquece seu coração um tantinho.


Mas o humor não consegue ser efetivo se seus personagens são desinteressantes. Ainda bem que esse está longe de ser o caso de Lucky Star, pois eu adoro todas as figuras dessa série. Já dei uma breve descrição sobre cada um deles na seção anterior, mas acho que preciso falar mais sobre alguns que me marcaram bastante.

Tudo me leva a acreditar que a minha personagem favorita é a Kagami. O problema é que eu não vou conseguir explicar exatamente o porquê. Na teoria ela é só uma tsundere genérica que se estressa com facilidade e paga de durona, mas eu enxergo um charme fortíssimo na personalidade dela. Sempre sorrio quando ela briga com a Konata e quando fica constrangida, mas são os momentos que mostram um lado vulnerável e afetivo dela que me fazem sentir algo "especial" dentro de mim, na falta de uma definição melhor. Um bônus é que ela também é bem estilosa.


Também adoro a sua irmã Tsukasa, talvez a personagem que mais me fez rir. A fixação que tem por certas coisas é hilária, como quando ganha um celular novo e não desgruda dele, fica mandando mensagens cheias de emoticons para as pessoas. Ela não sabe tocar flauta, mas quer tocar a todo custo, o que resulta em um momento fraternal lindo com a sua irmã em que a Kagami toca perfeitamente e a Tsukasa destrói a música como se fosse um macaco com uma flauta.

Mas o melhor momento dela é um que fica fascinada pelo nome "vinagre balsâmico" e o repete sem parar ao longo do dia. Ela costuma estudar junto de sua irmã e da Konata, em sessões com bastante conversa, mas em um breve momento de silêncio de uma dessas, ela soltou um leve sussurro: "vinagre balsâmico". Amigos, eu ri com muita força. É esse tipo de aleatoriedade junto do mundano que eu amo em Lucky Star.


A Miyuki é como se fosse a personagem Mikuru de Haruhi Suzumiya feita da maneira correta, pois a personalidade e até a aparência das duas são idênticas. Ambas abusam involuntariamente do fator moe quando ficam envergonhadas e têm um corpo voluptuoso. A grande diferença entre as duas séries é que Lucky Star não explora sua personagem de maneira altamente apelativa como Haruhi faz, não precisa mostrá-la seminua e gemendo sem parar para torná-la memorável. Inclusive, o fanservice nesse anime é praticamente inexistente, outro mérito seu.


A química entre o Shiraishi e a Akira do Lucky Channel fez com que esse quadro se tornasse algo que eu ansiosamente esperava em cada episódio. Nunca me decepcionava ao chegar ao fim de um episódio e assistir os comentários secos da apresentadora e o esforço do Minoru em ser engraçado.


O melhor de tudo é que há uma certa continuidade entre as edições do quadro, como o desprazer ascendente da Akira com a sua falta de popularidade enquanto o Shiraishi se tornava mais popular e durante os episódios finais, em que vemos a queda do Lucky Channel com direito a troca de apresentadores, um co-apresentador destruindo o cenário e uma misteriosa personagem de moto.


Não gosta do Lucky Channel? Tá aqui a mensagem da Akira pra você!

Após uns 12 episódios, mais personagens começam a ser introduzidos ao elenco principal. Por alguns destes serem um tanto estereotipados e parecidos com outras figuras da série (Yutaka abusando do fator moe, Minami como uma genuína kuudere, Ayano comedida como a Miyuki, Misao com personalidade similar à Konata), fiquei com medo que isso fosse me incomodar, mas não aconteceu. O roteiro fez um bom trabalho em torná-los memoráveis e divertidos, mesmo que não fossem tão originais.


O relacionamento entre a Yutaka e a Minami é uma gracinha de se ver. Desde o dia que a Minami ajudou a Yutaka quando estava passando mal, a garotinha pequena não se desgruda de sua melhor amiga, falando dela sem parar para seus parentes e amigas. A garota alta é tímida demais para conseguir expressar seus sentimentos, mas seu rosto envergonhado deixa visível como a amizade da Yutaka é importante para ela. Também é cômico ver as interações da Yutaka com a família Izumi, já que ela é só uma garotinha normal e fica boiando quando a Konata e seu pai começam a falar de animes.


Eu me racho de rir com a voz da Patty. A graça já começa quando o nome dela é Patricia Martin – é sempre engraçado ver japoneses falando um nome desses. Mas a voz dela é sensacional porque ela é uma estudante americana, então a dubladora japonesa tenta forçar um sotaque estadunidense que soa ridículo, especialmente quando fala palavras gringas.

Outra personagem que rio só de ouvir a voz é a Misao, mas essa não tenho um motivo concreto para isso. Talvez seja porque combina muito com a sua personalidade despreocupada e risonha. O sotaque da professora Kuroi também me traz risadas – não sei de qual região é o sotaque, mas ele me dá a impressão de alguém do interior, terminando as frases sempre com “ya” e “na”. O fato de ela falar com um tom de deboche na maioria das vezes torna sua voz mais cômica ainda.



Mas a melhor introdução ao elenco é a Tamura. Durante os primeiros episódios em que aparece, ela era uma zé ninguém pra mim, mas um único episódio fez ela ir da água ao vinho no meu conceito. Quando começa a fantasiar suas amigas de maneira erótica, não tem quem a pare! E rapaz, as suas fantasias e reações exageradas são impagáveis. Ela tenta conter ao máximo esse seu instinto pervertido, mas ao ver as interações da Yutaka com a Minami, o bule começa a chiar fervorosamente.


ARTE

Grande parte do humor de Nichijou se dá em virtude de seu visual único, incrivelmente expressivo e exagerado com um dos melhores trabalhos de animação que já vi na vida. Esse não é o caso de Lucky Star – seu visual talvez seja o mais simples de todas as obras da KyoAni.

O desenho dos personagens é básico e o trabalho de animação em grande parte é tão comum que mal parece uma produção do estúdio, desde a movimentação dos personagens até as interações praticamente inexistentes com os cenários, os quais são apenas pinturas cuja única função é atuar como planos de fundo. Até mesmo os personagens de fundo mal se movimentam, isso quando são desenhados, porque as vezes eles são apenas silhuetas sem rosto.


Isso tudo pode fazer parecer que a arte do anime é fraca, mas não é. É apenas o seu estilo e combina direitinho com a série. O character design é charmoso, por mais simples que seja. Todas as personagens aparentam ser mais jovens do que são e isso acrescenta valor ao fator fofura da série, um de seus pontos positivos. Além disso, elas são mostradas com roupas diferentes em diversas situações, o que ajuda a enxergá-las como pessoas reais e não apenas desenhos.



Kagami sempre estilosíssima <3

Mas o fato da simplicidade ser o estilo predominante da obra faz com que certos momentos que fogem dessa estética visual sejam hilários. Os meus favoritos são quando a direção e a arte se tornam cinematográficas, fazendo uso de enquadramentos focados na expressividade corporal e facial dos personagens (será que a Naoko Yamada trabalhou nisso?), com uma iluminação e distribuição de cores que mudam completamente o estilo da série. O mais cômico é que nada de especial acontece em relação ao roteiro em algumas cenas que exploram isso, como no exemplo abaixo.

Uma conversa trivial com diversos planos detalhes. A razão? Absolutamente nenhuma.

Já em outras há um motivo para essa abordagem visual impactante, como nas emotivas que mencionei anteriormente e em algumas em que constroem um momento aparentemente importante para um personagem, só para acabar como uma piada e encerrar tal "evento" ao estilo artístico de sempre. Seguem dois exemplos dos respectivos tipos de cena:

Um momento de aflito na família Hiiragi que logo se torna um momento de ternura. Note o traalho de iluminação e sombreamento mais enfático que o normal.

Kagami prestes a ter um encontro amoroso, quando descobre que não era nada demais. Note o estilo cinematográfico dos três primeiros quadros, com enquadramentos mais intimistas. O último quadro volta ao visual normal da série.

Além dos trechos cinematográficos, existem alguns mais breves que exploram traços diferentes, tanto no cenário quanto nos personagens, como quando algum deles faz uma expressão facial destoante do estilo da série ou quando o cenário é desenhado de maneira detalhada. Mais exemplos abaixo:

Konata com uma expressão facial típica de animes shoujo dos anos 90.

Detalhe: o primeiro cenário é o final de uma cena e o segundo é o início de outra. Sim, esses desenhos contrastantes são mostrados um em seguida do outro.

Alguns desenhos assim às vezes são usados como transição de uma cena para outra. Nada a ver com o estilo da série.

Mas o ápice do traço diferente em Lucky Star é um personagem que guardei para falar sobre especificamente nessa seção: o Meito Anizawa. Sério, a primeira vez que esse cara apareceu eu chorei de rir de tão contrastante que é o design dele com o resto dos personagens, todo estilizado, parece que saiu direto de um shounen tipo JoJo ou Yu-Gi-Oh. Não só isso, mas as sequências com ele abusam de uma animação exagerada, cheia de explosões, raios e fogos.

Em sua participação especial no Lucky Channel, ele chega a girar igual o Taz e entrar em combustão! O melhor de tudo isso? Ele é simplesmente um vendedor de mangás que, junto de sua equipe igualmente estilizada, faz de tudo para vender seus produtos à Konata, mas raramente sucede. Desde sua introdução, eu ansiava por sua aparição em cada episódio seguinte e, sempre que aparecia, eu sorria como uma criança com um novo brinquedo.


Olha a diferença de tamanho dele em relação aos outros personagens. É quase um colosso!

No geral, a arte de Lucky Star contribui à experiência relaxante e divertida que a obra se propõe a entregar. Às vezes menos é mais, então não é necessário um espetáculo visual para mostrar garotas procrastinando para estudar e conversando sobre como é fácil de pegar no sono durante uma viagem de ônibus/trem.

ÁUDIO

Música é sempre importante em um trabalho de comédia e devo dizer que a trilha sonora de Lucky Star é tão divertida quanto o conteúdo da série. De verdade, têm composições que me fazem rir só de ouvir o começo delas tocando, como a tema da Konata. Algumas músicas são parecidas com as de Haruhi Suzumiya, o que não é de se espantar, já que o mesmo compositor trabalhou em ambos os animes.

Assim como em Haruhi (a um nível menor), a trilha de Lucky Star é eclética e transita entre diferentes gêneros, apesar de repetir frequentemente as mesmas composições. Uma de minhas favoritas é a tema do Lucky Channel, com sua sonoridade big band que parece ter saído direto de um Mario Kart. Seguem abaixo duas temas ótimas de se ouvir no seu dia-a-dia:

                       

                       

O trabalho de dublagem (japonesa) é ótimo, as vozes de cada personagem combinam perfeitamente com cada um deles. Já mencionei na seção HUMOR as figuras com vozes que me faziam rir só de ouvi-las começar a falar, mas no geral a atuação de todos é bem cômica. Uma sacada que adorei foi a de atribuírem a mesma dubladora da Haruhi para a Konata, visto que ela é fã da personagem. Apesar das vozes das duas serem distintas, em um episódio que a Konata faz cosplay dela, ela começa a falar e agir igualzinho à líder da SOS Brigade.

"Um membro da brigada não deveria ser lento assim!" 

Ela até dança a icônica ending Hare Hare Yukai!

Mas assim como na seção ARTE, guardei um personagem específico para falar nessa seção. Não é só um personagem, é A personagem, a mais importante de todos – a velha gordinha de cabelo enrolado!! Ela aparece em vários episódios como atendente ou funcionária de diversos lugares, sempre agindo com cortesia com seus clientes, apesar de dar uma espiadinha no que estão falando de vez em quando.

Por que eu falei dela na seção ÁUDIO? Porque ela é claramente dublada por um homem jovem fazendo voz de idosa e isso é sensacional. É outra personagem que me fazia rir só de aparecer. E dá a entender que não é a mesma senhora que aparece nesses lugares distintos, tanto que em um episódio aparecem diversas delas em uma única cena!


Como sempre, não posso deixar de falar sobre a abertura. É um caso similar ao de Nichijou, em que oferece uma boa noção do conteúdo que encontrará na série, juntando o comum ao aleatório com a letra nonsense sobre coisas do cotidiano e cenas dos personagens fazendo trivialidades. Mas o melhor certamente é a dança das meninas.

Parece que a KyoAni alcançou a maestria em criar coreografias hipnotizantes, como fez anteriormente com a ending Hare Hare Yukai de Haruhi Suzumiya que logo se tornou um fenômeno da internet. A música agitada também faz sua parte em tornar tudo mais cativante ainda. Sempre que assisto a abertura fico com vontade de imitar a giradinha de braço da Konata (com direito ao pulo de Saci) e a desfilada da Kagami.

                       

Mas o cálice sagrado da aleatoriedade de Lucky Star são seus encerramentos. Tudo começa pelo fato de cada episódio ter um diferente! Na primeira metade da série, os endings são uma imagem estática de uma porta de karaokê em que ouvimos as quatro protagonistas cantando diversas canções de animes antigos e programas de TV japoneses.

Grande parte desses não conhecemos, pois só passaram lá no Japão, exceto a tema icônica de Dragon Ball Z – Cha La Head Cha La! Pensa que você cantava mal essa música quando era criança? Então espera até ouvir a Konata destruindo a música como se estivesse matando uma garça! Inclusive, ela é quem interpreta o maior número de canções, o que não é um problema, já que seu canto é certamente o mais divertido, mas é legal quando as outras cantam também, já que suas vozes mudam bastante quando o fazem.

                       

Os endings da segunda metade da série transcendem a aleatoriedade para níveis jamais vistos antes. Todos eles contam com o dublador Minoru Shiraishi (sim, o personagem Minoru Shiraishi tem o mesmo nome do seu dublador) interpretando canções, dançando e improvisando diálogos na frente da câmera, com outros membros da equipe participando de vez em quando. Sério, esses encerramentos pareciam me dizer "não riu o suficiente durante o episódio? Pera aí que tenho algo especial pra ti então", porque é impossível não rir com o nível de ridicularidade disso.

Eu poderia construir um altar para o Shiraishi, porque esse cara é uma figura. Até a edição desses endings é digna de risadas, que usufrui de artifícios como efeitos visuais toscos, zooms no rosto do Shiraishi, legendas cômicas, fast forward, entre outros. Deixo aqui três dos meus encerramentos favoritos: a tema de abertura versão Shiraishi, uma medley interativa com duas garotas do elenco e uma batalha estilo Star Wars com grunhidos no lugar da música.

                       

                       

                       

CONCLUSÃO

Quando comecei a assistir Lucky Star, nunca pensei que essa viria a se tornar minha animação favorita de comédia. Diferente de muitas séries exclusivas desse gênero, essa não falhou um segundo sequer em me deixar com um sorriso enorme no rosto o tempo inteiro e em me arrancar diversas gargalhadas ao longo dos episódios. Há mais charme do que se aparenta em assistir pessoas tendo as conversas mais banais, ordinárias e comuns possíveis, especialmente quando se tem um elenco de personagens que transborda carisma, um humor que une o trivial ao aleatório e referências a tudo que você pode imaginar.


-por Vinicius "vini64" Pires

Leia também minhas outras análises sobre animes da Kyoto Animation:
Comentários
2 Comentários

2 comentários:

yokoelf disse...

Ótimo review, agradável de ler. Foi legal para relembrar algumas coisas, como o Lucky Channel, e entender melhor a série :)

Neofox disse...

Review maravilhoso, nunca tinha achado um assim em português!!! Acho uma pena que não fizeram uma segunda temporada do anime, e o mangá parece estar num ritmo de publicação bem lento no Japão...