Em
outubro, decidi assistir a uma série dos anos 90 do World Masterpiece Theater
para tirar a prova viva de que as produções eram fracas se comparadas às dos
anos 70. O que ficou comprovado, no entanto, é que essa afirmação era na
verdade uma baita mentira, pois Little Women II acabou se tornando uma de
minhas animações favoritas do bloco (leia meu review). Com isso em vista, parti para mais uma da
década de 90 que veio dois anos depois dessa para conferir se a qualidade se
manteve.
Romeo’s
Blue Skies (jp: Romeo no Aoi Sora), de 1995, é uma adaptação do romance suíço Die
schwarzen Brüder (The Black Brothers). A animação nos mostra a história de um
garoto que deve sobreviver em condições precárias como limpador de chaminés em
Milão, Itália após ser vendido para ajudar sua família. Infelizmente, a
popularidade do World Masterpiece Theater já estava em declínio ao lançamento
dessa produção, o que fez com que ela contasse com apenas 33 episódios, algo
que prejudicou o desenvolvimento da história.
PERSONAGENS
O
protagonista é Romeo, um garotinho destemido de 11 anos que faz de tudo para
não se deixar abater por nada, independente da situação. Em seu caminho à
Itália, após ser vendido como limpador de chaminés, ele encontra Alfredo
Martini, um misterioso garoto com sua mesma idade. Ao descobrir que ele
compartilha de seu mesmo destino, os dois se unem para enfrentar todas as
adversidades que encontrarão durante essa árdua fase de suas vidas, formando um
elo de amizade inquebrável.
Porém,
essa dura realidade não é exclusiva somente a eles - inúmeras crianças são
obrigadas a trabalhar como limpadoras de chaminés, submetidas a condições
subumanas. Ao descobrir isso, Romeo e Alfredo decidem juntar todos esses
garotos e formar uma fraternidade chamada The Black Brothers (Os Irmão Pretos,
cor que representa a fuligem das chaminés que impregna seus corpos), para se
apoiarem e se manterem unidos em toda e qualquer situação.
Como
se já não bastasse o sufoco que passam em seu trabalho forçado e a violência
que são submetidos às mãos de seus chefes, esses garotos ainda precisam ter
cuidado com cada passo que dão em Milão devido à gangue Wolf Pack (Bando do
Lobo), um grupo de jovens rebeldes que gostam de roubar alimentos e sentar porrada
nos outros.
Muitos
personagens, não é mesmo? É aí que reside o problema da série: o
desenvolvimento deles. Quanto aos protagonistas, não tenho o que reclamar, são
personagens com diversas camadas de profundidade, com intenções claras e bem
motivadas. O mesmo não pode ser dito para grande parte dos integrantes dos
Black Brothers e do Wolf Pack - você sequer lembra seus nomes em detrimento do
destaque mínimo que lhes é dado. O roteiro não faz questão alguma de
individualizar cada um dos membros. Fora os que mais ficam em primeiro plano,
os demais parecem estar ali apenas para dar volume.
Mas
o ponto mais baixo de desenvolvimento de personagens em Romeo são os vilões. Primeiro que eu já acho errado ter que
empregar o termo “vilão” para os antagonistas de uma série do WMT, já que na
vida real não existem vilões propriamente ditos, ou seja, pessoas que sempre
estão com um sorriso maléfico no rosto, gesticulando com as mãos enquanto
pensam em inúmeras maneiras de acabar com a vida de alguém e soltando risadas
diabólicas sempre que alguém se dá mal. O que existe são indivíduos com más
intenções e valores deturpados, os quais são bem representados nas demais
animações do WMT que assisti.
Infelizmente
esse não é o caso dessa série. Os vilões são completamente bidimensionais, com
motivações rasas cujo único propósito é fazer o protagonista sofrer. Por mais
que a intenção dos roteiristas talvez tenha sido mostrar como esses
antagonistas são subumanos, eles fizeram isso de uma maneira que eu
simplesmente não consigo enxergá-los como pessoas de verdade, pois não há
profundidade em suas personalidades.
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Personagem com "VILÃO" estampado em seu rosto. |
Outro
fator agravante é a quantidade de vilões. O foco das animações do World
Masterpiece Theater é o realismo, mas não tem como você enxergar certas
situações como realistas com mais de seis sujeitos mal-encarados fazendo de tudo
para ferrar com o mocinho. Os tios do Alfredo com aquela velha motivação batida
de recuperar um artefato de família que os deixará ricos é tão clichê que eu
quase me esqueci que estava assistindo a uma série do WMT.
ARTE
Tá
aí um departamento que eu não tenho o que botar defeito na maioria das
animações do World Masterpiece Theater. O trabalho artístico da Nippon
Animation sempre é consistente, raramente deixa a desejar. Os cenários são
primorosos, especialmente as pinturas de construções que chegam a impressionar
de tão meticuloso que é o desenho delas, repletas de detalhes. Você realmente
se sente na Itália do século passado.
O
design de personagens é sólido, realizado por Yoshiharu Sato, o mesmo character
designer de Little Women II e Pollyanna. O design é simples e combina
perfeitamente com a época em que a história se passa. Sou um fã do trabalho
desse sujeito, tenho que admitir.
Quanto
à trilha sonora, não tenho nada a reclamar, porém também não tenho nada a
elogiar, pois nenhuma composição se destaca nem incomoda. Tem uma cançãozinha
tema dos limpadores de chaminé que é um tanto quanto cativante, mas não demora
muito para você esquecê-la. No entanto, as músicas de abertura e encerramento
são ótimas, como é de praxe dessas animações.
EMO(A)ÇÃO
O ponto forte de todas as animações do World Masterpiece Theater é, sem sombra
de dúvidas, a carga emocional e sentimental. Este aspecto é explorado de
maneira tão esplendorosa que você se torna uma pessoa mais empática por meio do
que é mostrado em tela. Isso se deve ao fato de as situações serem realistas,
momentos que passamos ou passaremos em nossas vidas. Nós conseguimos nos botar
na pele desses personagens porque você realmente sente as dificuldades ou a felicidade
que eles estão passando e sentindo.
Contudo, em Romeo eles decidiram dar
mais foco às sequências de ação, talvez para atrair um novo público já que a
popularidade do WMT estava em declínio, algo que prejudicou em demasia a carga
emocional da narrativa. O
problema da série é ela dar a entender que assistiremos a uma história realista
da vida das crianças limpadoras de chaminés, quando na verdade nos é mostrado
um conto quase que fantasioso de garotos brigando para combater o mal ao seu
redor. Certos acontecimentos não se encaixam na realidade em que eles vivem,
como o fato deles conseguirem se reunir sempre que querem apesar de terem donos
extremamente rígidos.
Essa abordagem voltada a ação fez com que o desenvolvimento de diversas
situações fosse medíocre, sem muita substância, especialmente em relação às
resoluções previsíveis e convenientes. Sério, tem um certo ponto da história em
que uma personagem com complicações graves de saúde perde a vontade de viver,
mas acorda miraculosamente quando a avó dela aparece em sua casa. Eu podia
jurar que estava assistindo a uma animação da Disney.
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Uma briga vencida pela intervenção divina do reflexo do sol no amuleto que cegou o adversário. Ai ai ai... |
Mas
se tem uma mensagem muito bem executada nessa animação é a de amizade. Esse é
indubitavelmente o tema central dela. O elo afetivo entre os Black Brothers e
especialmente entre Romeo e Alfredo é inspirador e nos mostra como dificuldades
são feitas para serem superadas com a ajuda dos verdadeiros amigos.
É uma pena que tudo o que mencionei ao longo deste artigo fez com que isso não me
tocasse tanto quanto deveria, mas não há dúvidas de que é uma linda relação
capaz de inspirar qualquer um a dar mais valor às suas amizades.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
A falta de realismo e o desenvolvimento
fraco de situações e personagens são coisas que subtraem imensamente minha
satisfação em séries do World Masterpiece Theater. Romeo é uma produção cheia desses problemas, mas que pode agradar
aqueles que gostam de uma boa ação e aventura. É o desenho mais acessível do
WMT, mas não chega nem perto de ser uma representação digna do que essa coleção
de animações tem a oferecer.
-por Vinicius "vini64" Pires
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