Quando você fica fascinado pelo trabalho de um diretor, não
basta apenas ver os filmes que dirigiu, deve-se procurar assistir todo o
trabalho diretorial deste, o que pode incluir séries, clipes musicais,
comerciais de TV, etc. No caso de Hayao Miyazaki, não foi apenas seu estilo de
direção que me fascinou, mas principalmente a beleza encontrada em suas
animações que transpiram vida e os temas que aborda em praticamente todas elas,
sempre procurando passar mensagens humanistas e ambientalistas. Foi isso o que
me levou a assistir Heidi, obra de Isao Takahata em que ele trabalhou como designer
de cenários (confira meu artigo), e agora Future Boy Conan, adaptação de 1978
do livro The Incredible Tide do escritor britânico Alexander Key. Este é o seu
primeiro trabalho diretorial e a única série em que foi tanto diretor como
escritor e character designer.
HISTÓRIA
No início de cada episódio o seguinte acontecimento abaixo era contado antes da animação de abertura:
“Julho de 2008. A humanidade estava enfrentando uma crise que ameaçava a extinção de sua espécie. Armas supermagnéticas muito mais destrutivas que armas nucleares fizeram com que uma metade do mundo fosse dizimada em um instante. A Terra foi dominada por grandes perturbações tectônicas e o seu eixo se retorceu. Os cinco continentes foram completamente destroçados e afundaram no mar.”
No ápice deste conflito, um foguete carregando diversos responsáveis pela destruição do planeta foi lançado para escapar do local, mas a nave perdeu força ao chegar no espaço e caiu de volta para a Terra. Os tripulantes dela foram forçados a viver em uma pequena ilha que um dia fora um continente inteiro, agora desprovida de qualquer tipo de recurso natural, nem mesmo água, já que a do mar estava altamente contaminada pelos artefatos usados na guerra. Após algumas mortes, os sobreviventes puderam presenciar o renascimento da natureza naquela ilha, o que consideraram a vida voltando para eles, já que impediu que se juntassem aos que já foram. Eles aprenderam a viver apenas de bens naturais, sem nenhuma tecnologia para causar distúrbios.
Depois de diversos anos de vida aproveitada, apenas um tripulante da nave continua vivo, mas ele não está sozinho – uma criança, fruto do relacionamento de um casal já falecido, o faz companhia. Seu nome é Conan, um garoto de (aparentemente) 12 anos. Ele gosta de nadar, caçar peixes, correr por aí e usa os pés mais do que as mãos para realizar seus afazeres (sério, a força que ele tem nos pés deve ser o suficiente para enforcar um maromba de academia). Nunca tendo contato com ninguém além do senhor que vive junto dele (o qual ele chama de “vovô”), sua vida muda quando uma garota aparece desmaiada na beira do mar, rodeada por pássaros. É então que conhecemos Lana, uma menina que pode se comunicar telepaticamente com aqueles que ama. Logo é descoberto que ela está sendo procurada pelos oficiais de um local chamado Industria, uma cidade-estado que foi reerguida após o cataclismo, mas que deseja recuperar toda a tecnologia perdida no desastre, a mesma que o causou. Acontece que Lana é a chave para resgatá-la, já que é necessária energia solar para fazê-lo e o avô da garota, Briac Lao, é o único sobrevivente do Grande Desastre com conhecimento desse tipo de energia.
Após Lana ser capturada, Conan começa sua aventura para salvar o mundo e
impedir que essa tecnologia seja revivida. Ele encontra diversas companhias no
caminho, como Jimsy, um garoto que tem a aparência de um índio e que adora
comer tudo o que encontrar pela frente, e o Capitão Dyce, um marinheiro
egocêntrico que comanda um navio chamado Barracuda e que diz “viver para o
mar”. Do lado ruim da moeda, temos os oficiais de Industria, como Monsley, uma mulher que sempre aparece nos
momentos mais importunos portando armas e hidroaviões para impedir o progresso
dos que querem o bem do mundo. Ela é o pau-mandado de Lepka, o sujeito que
governa Industria e aspirante a ditador. Apesar de dizer querer a energia solar
para o bem da localidade, sua única ambição é ter o poder daqueles que
destruíram o mundo em suas mãos.
Jimsy, Dyce e Conan
TEMAS
Quando se vai assistir o primeiro trabalho de um diretor, a primeira coisa que se imagina é que ele não abordará os temas característicos de sua carreira. Pelo menos foi o que eu pensei, mas me enganei duramente. O tema principal de Future Boy Conan é aquele que aparece em quase todas as obras de Miyazaki: natureza X a intervenção da humanidade/tecnologia. A trama que carrega a série é uma Terceira Guerra Mundial que destruiu o planeta Terra, conflito que só foi possível graças à tecnologia adquirida abusando dos recursos naturais, abolindo-os. Presumo que essa era a visão do que seria o futuro na mente do diretor. A Segunda Guerra Mundial e suas bombas nucleares têm uma enorme participação nisso, já que, começando com essa série, sua principal intenção era fazer com que as novas gerações sejam inspiradas por suas animações que mostram a importância da natureza na vida das pessoas.
Continuando neste tópico de natureza X tecnologia, a série conta com dois polos extremos: Industria e High Harbor. A primeira é uma cidade, como o nome já diz, puramente industrial, sem nenhum resquício sequer de natureza. Tudo o que se encontra lá é concreto, plástico e metal. Até mesmo a comida é sintética, com os pães sendo feitos a partir do plástico. Lá vivem indivíduos que acreditam que a natureza é superficial, que a tecnologia pode suprir todas as necessidades onde ela seria necessária. O fato é que, à medida que a tecnologia vai avançando, mais possibilidades de poder e dominação vão surgindo, o que se torna uma necessidade para aqueles que estão em contato com ela. É assim que as pessoas ficam gananciosas e egoístas. O contraste desse cenário é High Harbor, uma vila sem intervenção tecnológica alguma, repleta de natureza, onde até a área industrial é movida por esta. As pessoas lá vivem umas para as outras e para a natureza, onde todas tem um espírito altruísta. É um lugar idílico e utópico, o mundo como Miyazaki gostaria que fosse. Na seção LOCALIDADES eu abordarei mais a fundo essa relação (ou a falta dela) entre os dois locais.
Em um cenário como este até a alma mais impura vira altruísta.
Na estória original de Alexander Key, Conan e Lana são adolescentes de 17 e 18 anos e vivenciaram o cataclismo. É aí que percebemos outro aspecto marcante das obras do diretor – crianças protagonizando a história. Em mais da metade dos filmes dele temos crianças como os personagens principais. Qual seria o motivo disso? Porque ele acha mais legal usar crianças, mais fofinho? Não, pois ele quer que as crianças que estiverem assistindo se coloquem no lugar delas. É muito mais fácil elas se inspirarem em uma personagem da mesma idade delas do que em um adulto. E não é só por isso que Conan e Lana são crianças, mas também porque eles são tidos como “a nova geração” do mundo representado nessa obra, aqueles que nasceram após o Grande Desastre (diferente da obra original) e que conduzirão o mundo para tempos auspiciosos através da bondade em seus corações e de sua vontade de viver. Novamente, a Segunda Guerra tem influência nisso, já que essa animação foi feita para a geração que nasceu após este conflito, ou seja, assim como os protagonistas dela são “a nova geração” com um propósito definido na vida, as crianças que a assistissem deveriam assumir este mesmo propósito para impedir que o Japão passasse novamente por todo o caos que o desolou.
"A nova geração".
Agora gostaria de falar um pouco sobre o desenvolvimento dos personagens, algo
que é praticado em ênfase nessa série. Como já abordei Conan e Lana no parágrafo
acima, só vou dar uma complementada. A única coisa que motiva o garoto a dar o
máximo de si são os seus amigos e a vontade de vê-los felizes e em segurança. Mesma
coisa para Lana. Mesmo nas situações mais difíceis, ela persevera por causa da
confiança que tem em seus amigos.
O Lepka é um sujeito que só liga para a realização de sua única ambição, acabando com qualquer tipo de vida que encontrar pela frente. É como se fosse um ser humano sem humanidade. Mas ele também fica irritado e se desespera com facilidade sempre que as coisas não saem do jeito que deseja. Esse perfil é encontrado em todas as produções do Miyazaki que contam com um vilão de personalidade bidimensional, como o Conte Cagliostro em O Castelo de Cagliostro e o Muska em O Castelo no Céu, mas o diretor já disse em entrevistas que não gosta de fazer vilões sem profundidade como eles, cuja única ambição é dominar o mundo. Temos um exemplo de vilão que foge desse padrão nessa própria série na personagem Monsley, uma mulher que trabalha para o Lepka, sabe manejar qualquer tipo de arma e capturar crianças como ninguém. Acontece que ela presenciou a destruição dos continentes e viveu a infância mais perturbada possível, o que afetou a mente dela e fez com que caísse nos papos de Lepka de que o modo de vida ideal é o de Industria e que, com poder bélico em suas mãos, ela não presenciaria novamente aquele acontecimento que devastou sua vida. Talvez tudo que ela precise seja de um choque de realidade...
"Todos querem viver perto da natureza".
Certos personagens contribuem para o fator cômico da série, como o Jimsy e o Capitão Dyce. O Jimsy já é engraçado por si só pela sua voz áspera, mas a coisa vai ficando melhor com seus comentários sobre comidas e o jeito como ele age durante as situações mais complicadas. E o por falar em comentários, o ápice do humor em Future Boy Conan é o Capitão Dyce. Ele é um cara de uma natureza completamente imprevisível, você nunca consegue imaginar qual será sua próxima ação. Contudo, na maioria das vezes, seu ego fala mais alto e sempre faz algo para satisfazer seus próprios desejos. Esse marinheiro é um cara bem egoísta que só liga para as suas próprias necessidades, tomando medidas drásticas até mesmo com aqueles que o ajudaram a sobreviver para realizar suas ambições. Isso não impede que ríamos com as tiradas que solta sempre que está em tela, geralmente alguma coisa relacionada ao mar, algum ato de desespero, algum comentário sobre algo ou alguém – sempre falando mau, é claro – e o jeito como ele trata a Lana, sempre a chamando de “Lana-chan” como se estivesse apaixonado. Tirando suas atitudes mesquinhas, que vão sumindo aos poucos, acho que o Dyce é meu personagem favorito da série.
LOCALIDADES
Algo que me deixou fascinado nessa série foi o design dos cenários e a arquitetura dos locais onde ela se passa, especialmente Industria. Este local acho que é um dos mais bem pensados que já vi em qualquer animação. A arquitetura principal é composta por três torres interligadas, formando um complexo chamado Triangle Tower. Neste lugar vemos todo tipo de tecnologia que só pode ser encontrada lá, como fábricas de produtos sintéticos, salas de controle com diversos radares e painéis de LED, armas lasers que se projetam para fora das paredes da torre, e claro, portas que são acionadas por sensores. Pouca coisa é feita manualmente em Industria. Os planos que o diretor faz neste local procuram mostrar o quão vazio e desprovido de vida ele é.
A Triangle Tower.
Para se locomover entre as torres, a pessoa pode escolher andar pelos fundos de cada uma delas, onde há um vão imenso no formato de um triângulo que chega a ser assustador. Lá existem portas que levam para diversas áreas diferentes de cada torre. A segunda opção, reservada para os oficiais do local e, claro, para os invasores, é usar umas espécies de escorregadores que conectam aos lugares mais importantes do complexo, como às salas de controle, às fábricas e ao subterrâneo. Este último é a área mais complexa de toda a Industria. É como se fosse um enorme labirinto, cheio de túneis e que se expande até os confins da Terra (ok, estou exagerando, mas é quase isso). Em uma seção dele há uma área residencial, onde vivem escravos e pessoas subordinadas por Lepka. O local é tão extenso e labiríntico que os moradores dessa área que se rebelaram contra as autoridades conhecem caminhos e passagens secretas que não constam no mapa oficial. A superfície de Industria, com a Triangle Tower e as ruas desertas, se comparada em tamanho com o subterrâneo é como se fosse a internet que navegamos contra a Deep Web.
Um mapa esquemático de Industria.
Contrastando em demasia com o território altamente tecnológico de Industria, temos High Harbor, a vila onde Lana foi criada, um local onde nenhum tipo de tecnologia jamais pôs seus pés, onde apenas a natureza reina soberana. É o mundo dos sonhos de Miyazaki, uma cidade utópica repleta de tudo aquilo que é natural por todos os lados. Os planos dão muita ênfase nessa questão, procurando mostrar toda a fauna e flora que lá habita, uma característica sempre presente nos trabalhos do diretor. Até mesmo a parte industrial da vila é movida apenas pelo vento, sem nenhuma intervenção que “danifique o mundo como ele deve ser”. Acredito que seja por este fato que Miyazaki fez High Harbor ser a única localidade que não afundou no mar durante o Grande Desastre, algo que não os privou de sofrerem os efeitos deste, o que os fez passarem por enormes adversidades. Porém, eles as superaram e conseguiram fazer do local o maior exemplo de sinergia entre humanidade e natureza, onde todos se ajudam sem fazer nenhum mal a ela.
Um mundo perfeito para se viver como imaginado por Hayao Miyazaki.
Esses dois locais descritos acima são os principais da série, praticamente a trama inteira se passa neles. Mas fora eles, temos a ilha onde Conan foi criado, Remnant Island (algo como “A ilha que restou”), e, apesar de ficarmos pouco neste lugar, a ilha de Jimsy, My Island, que se destaca pelo seu nome cômico.
TRILHA SONORA
Um aspecto que eu não poderia deixar de abordar nesse artigo é a trilha sonora da série. Nos anos 80, a trilha musical de quase todas as produções audiovisuais eram sintetizadas, ou seja, o sintetizador era o instrumento que conduzia todas as músicas e às vezes era o único usado. Future Boy Conan, apesar de ser do final dos anos 70, já começava a usar esse tipo de trilha que viria a ser padrão alguns anos à frente. Porém, diferente da maioria das produções da década seguinte, onde todo instrumento era sintetizado, até mesmo guitarra, bateria e baixo, o som de Conan, além do sintetizador, conta com uma banda de verdade e uma orquestra, o que dá um ar mais agradável às composições. Praticamente todas as músicas tem um ritmo bem acelerado que, no começo, você até estranha, pois parece não combinar muito, mas depois elas começam a te cativar mais do que deveriam e te ambientam na situação melhor do que qualquer outra trilha sonora oitentista. Um exemplo disso são as cenas de ação e perseguição, que sempre contam com as duas composições que você ouve logo abaixo.
Claro que a série também conta com músicas mais calmas, como a tema da Lana e do Conan, que é tocada sempre que eles estão compartilhando um momento de harmonia ou de ternura, uma combinação linda entre imagem e áudio, e também conta com temas cômicos, já que esse fator está presente em grande escala em Future Boy Conan. Agora outra composição que acho fantástica é a tema de abertura. Sabe aquela música que te passa uma positividade enorme e te faz dar valor ao mundo em que vive? Essa é uma delas. Quando você vê o Conan e a Lana no mar junto das letras “Nade, faça ondas! Corra, chute o solo!” e depois eles dois correndo em um morro gramado ao som de “Cante, mostre a sua voz! Dance, junte suas mãos!” a vontade que você tem é de fazer exatamente o que é dito e mostrado na tela.
REFERÊNCIAS MIYAZAKIANAS
Como havia dito um pouco na seção TEMAS, essa série contém diversos temas (redundância, alô?) que seriam usados extensivamente ao longo de sua carreira, mas isso não se restringe apenas a questões narrativas – Conan conta com diversas características e estéticas que apareceriam em diversos filmes de Hayao Miyazaki, como similaridade entre personagens e suas ações. Abaixo listarei as que consegui perceber.
Conan e Pazu (O Castelo no Céu). Dois personagens não só visualmente semelhantes em suas aparências, mas também em suas ações e habilidades. Ambos são exímios escaladores de, hmm, qualquer tipo de estrutura e são fortes até de mais para a sua idade. Ah, e nenhum deles hesita na hora de arriscar a própria vida para salvar uma garota que acabou de conhecer.
Lana e Sheeta (O Castelo no Céu). Duas garotinhas com poderes especiais que estão sendo constantemente raptadas por autoridades e piratas por serem a chave para uma tecnologia perdida. São bem similares em aparência também, com direito a tranças e àquele olhar de deixar qualquer um com dó. Mas não deixe que o rostinho frágil delas o engane, porque elas não pensam duas vezes na hora de atacar fisicamente aspirantes a ditador.
Lepka e Muska (O Castelo no Céu). E falando em aspirantes a ditador, cá estão os antagonistas de Conan e Laputa. Muska é como se fosse o Lepka depois de um rigoroso regime e uma bela plástica, mas os dois agem quase que identicamente, não medindo esforços para realizarem suas ambições de dominar o mundo com uma tecnologia perdida. Só que na hora que a situação esquenta pro lado deles, vemos como esses caras sem escrúpulos se desesperam.
Tratando-se de narrativa, a maneira como as protagonistas femininas de Conan e Laputa são encontradas é muito similar. Uma aparece na beira da praia desmaiada após fugir de um navio pirata e a outra despenca de um dirigível ao fugir de piratas, aterrissando nas mãos de Pazu, desmaiada. Ambos os garotos se espantam ao achá-las.
Ok, essas duas cenas podem não ter muita relação entre si, pois a Lana se comunica com os pássaros, enquanto estes só estão comendo ração na mão de Sheeta, sem nenhum vínculo telepático, mas creio que Miyazaki quis referenciar a relação que a protagonista de Conan tinha com as aves nessa cena de Laputa.
Ao tentar impedir que o vilão ou um cara mal faça algo para machucar o protagonista, a mocinha é jogada para longe com tudo e colide com força na parede. Esse cenário está presente em alguns filmes do diretor, mas foi originado nessa série (aparecendo mais de uma vez).
Aqui temos algo que pode ou não ser uma referência. O Jimsy adora comer sapos e répteis tostados, fazendo de tudo para conseguir um. Isso me lembrou bastante aquele funcionário da casa de banho que adora comer lagartixa em A Viagem de Chihiro.
Uma árvore enorme e imponente sendo olhada de baixo, as pessoas que o fazem maravilhadas. O plano na tela nos mostra a visão de quem está a vendo com todos os detalhes possíveis para que tenhamos a mesma sensação que o personagem. Esse tipo de cena aparece em diversas produções em que o Miyazaki está envolvido, sendo a primeira vez em Heidi, A Garota dos Alpes. A árvore é como um corpo celestial e sagrado para o diretor, então acho que isso explica o motivo desse tipo de plano ser tão explorado em seus filmes.
Giganto e Goliath (O Castelo no Céu). Duas aeronaves bélicas de proporções extraordinárias que destroem qualquer outra máquina voadora que apareça em sua frente. São bem semelhantes e utilizadas pelo antagonista de ambas as obras.
Essa aqui não é uma referência nem nada, só algo que ressoou em mim. O momento em que o Conan faz um joinha para seus amigos no topo de uma nave me lembrou quase que instantaneamente quando Nausicaä faz o mesmo para confortar o povo de seu vale no filme Nausicaä do Vale do Vento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No fim das contas, o primeiro trabalho diretorial de Hayao Miyazaki é tão bom quanto algumas de suas futuras obras, abordando temas que se tornariam um marco em todas as suas produções de uma maneira convincente e inspiradora para as novas gerações dos anos 70, com um trabalho magnífico de construção de cenários, locais e profundidade de personagens. Future Boy Conan pavimentou o caminho para futuras direções que o tornariam a figura mundialmente conhecida que é hoje.
-por Vinicius "vini64" Pires
Leia também meus outros textos sobre trabalhos do Studio Ghibli e relacionados:
HISTÓRIA
No início de cada episódio o seguinte acontecimento abaixo era contado antes da animação de abertura:
“Julho de 2008. A humanidade estava enfrentando uma crise que ameaçava a extinção de sua espécie. Armas supermagnéticas muito mais destrutivas que armas nucleares fizeram com que uma metade do mundo fosse dizimada em um instante. A Terra foi dominada por grandes perturbações tectônicas e o seu eixo se retorceu. Os cinco continentes foram completamente destroçados e afundaram no mar.”
No ápice deste conflito, um foguete carregando diversos responsáveis pela destruição do planeta foi lançado para escapar do local, mas a nave perdeu força ao chegar no espaço e caiu de volta para a Terra. Os tripulantes dela foram forçados a viver em uma pequena ilha que um dia fora um continente inteiro, agora desprovida de qualquer tipo de recurso natural, nem mesmo água, já que a do mar estava altamente contaminada pelos artefatos usados na guerra. Após algumas mortes, os sobreviventes puderam presenciar o renascimento da natureza naquela ilha, o que consideraram a vida voltando para eles, já que impediu que se juntassem aos que já foram. Eles aprenderam a viver apenas de bens naturais, sem nenhuma tecnologia para causar distúrbios.
Depois de diversos anos de vida aproveitada, apenas um tripulante da nave continua vivo, mas ele não está sozinho – uma criança, fruto do relacionamento de um casal já falecido, o faz companhia. Seu nome é Conan, um garoto de (aparentemente) 12 anos. Ele gosta de nadar, caçar peixes, correr por aí e usa os pés mais do que as mãos para realizar seus afazeres (sério, a força que ele tem nos pés deve ser o suficiente para enforcar um maromba de academia). Nunca tendo contato com ninguém além do senhor que vive junto dele (o qual ele chama de “vovô”), sua vida muda quando uma garota aparece desmaiada na beira do mar, rodeada por pássaros. É então que conhecemos Lana, uma menina que pode se comunicar telepaticamente com aqueles que ama. Logo é descoberto que ela está sendo procurada pelos oficiais de um local chamado Industria, uma cidade-estado que foi reerguida após o cataclismo, mas que deseja recuperar toda a tecnologia perdida no desastre, a mesma que o causou. Acontece que Lana é a chave para resgatá-la, já que é necessária energia solar para fazê-lo e o avô da garota, Briac Lao, é o único sobrevivente do Grande Desastre com conhecimento desse tipo de energia.
Conan e Lana
Jimsy, Dyce e Conan
TEMAS
Quando se vai assistir o primeiro trabalho de um diretor, a primeira coisa que se imagina é que ele não abordará os temas característicos de sua carreira. Pelo menos foi o que eu pensei, mas me enganei duramente. O tema principal de Future Boy Conan é aquele que aparece em quase todas as obras de Miyazaki: natureza X a intervenção da humanidade/tecnologia. A trama que carrega a série é uma Terceira Guerra Mundial que destruiu o planeta Terra, conflito que só foi possível graças à tecnologia adquirida abusando dos recursos naturais, abolindo-os. Presumo que essa era a visão do que seria o futuro na mente do diretor. A Segunda Guerra Mundial e suas bombas nucleares têm uma enorme participação nisso, já que, começando com essa série, sua principal intenção era fazer com que as novas gerações sejam inspiradas por suas animações que mostram a importância da natureza na vida das pessoas.
Continuando neste tópico de natureza X tecnologia, a série conta com dois polos extremos: Industria e High Harbor. A primeira é uma cidade, como o nome já diz, puramente industrial, sem nenhum resquício sequer de natureza. Tudo o que se encontra lá é concreto, plástico e metal. Até mesmo a comida é sintética, com os pães sendo feitos a partir do plástico. Lá vivem indivíduos que acreditam que a natureza é superficial, que a tecnologia pode suprir todas as necessidades onde ela seria necessária. O fato é que, à medida que a tecnologia vai avançando, mais possibilidades de poder e dominação vão surgindo, o que se torna uma necessidade para aqueles que estão em contato com ela. É assim que as pessoas ficam gananciosas e egoístas. O contraste desse cenário é High Harbor, uma vila sem intervenção tecnológica alguma, repleta de natureza, onde até a área industrial é movida por esta. As pessoas lá vivem umas para as outras e para a natureza, onde todas tem um espírito altruísta. É um lugar idílico e utópico, o mundo como Miyazaki gostaria que fosse. Na seção LOCALIDADES eu abordarei mais a fundo essa relação (ou a falta dela) entre os dois locais.
Em um cenário como este até a alma mais impura vira altruísta.
Na estória original de Alexander Key, Conan e Lana são adolescentes de 17 e 18 anos e vivenciaram o cataclismo. É aí que percebemos outro aspecto marcante das obras do diretor – crianças protagonizando a história. Em mais da metade dos filmes dele temos crianças como os personagens principais. Qual seria o motivo disso? Porque ele acha mais legal usar crianças, mais fofinho? Não, pois ele quer que as crianças que estiverem assistindo se coloquem no lugar delas. É muito mais fácil elas se inspirarem em uma personagem da mesma idade delas do que em um adulto. E não é só por isso que Conan e Lana são crianças, mas também porque eles são tidos como “a nova geração” do mundo representado nessa obra, aqueles que nasceram após o Grande Desastre (diferente da obra original) e que conduzirão o mundo para tempos auspiciosos através da bondade em seus corações e de sua vontade de viver. Novamente, a Segunda Guerra tem influência nisso, já que essa animação foi feita para a geração que nasceu após este conflito, ou seja, assim como os protagonistas dela são “a nova geração” com um propósito definido na vida, as crianças que a assistissem deveriam assumir este mesmo propósito para impedir que o Japão passasse novamente por todo o caos que o desolou.
"A nova geração".
O Lepka é um sujeito que só liga para a realização de sua única ambição, acabando com qualquer tipo de vida que encontrar pela frente. É como se fosse um ser humano sem humanidade. Mas ele também fica irritado e se desespera com facilidade sempre que as coisas não saem do jeito que deseja. Esse perfil é encontrado em todas as produções do Miyazaki que contam com um vilão de personalidade bidimensional, como o Conte Cagliostro em O Castelo de Cagliostro e o Muska em O Castelo no Céu, mas o diretor já disse em entrevistas que não gosta de fazer vilões sem profundidade como eles, cuja única ambição é dominar o mundo. Temos um exemplo de vilão que foge desse padrão nessa própria série na personagem Monsley, uma mulher que trabalha para o Lepka, sabe manejar qualquer tipo de arma e capturar crianças como ninguém. Acontece que ela presenciou a destruição dos continentes e viveu a infância mais perturbada possível, o que afetou a mente dela e fez com que caísse nos papos de Lepka de que o modo de vida ideal é o de Industria e que, com poder bélico em suas mãos, ela não presenciaria novamente aquele acontecimento que devastou sua vida. Talvez tudo que ela precise seja de um choque de realidade...
"Todos querem viver perto da natureza".
Certos personagens contribuem para o fator cômico da série, como o Jimsy e o Capitão Dyce. O Jimsy já é engraçado por si só pela sua voz áspera, mas a coisa vai ficando melhor com seus comentários sobre comidas e o jeito como ele age durante as situações mais complicadas. E o por falar em comentários, o ápice do humor em Future Boy Conan é o Capitão Dyce. Ele é um cara de uma natureza completamente imprevisível, você nunca consegue imaginar qual será sua próxima ação. Contudo, na maioria das vezes, seu ego fala mais alto e sempre faz algo para satisfazer seus próprios desejos. Esse marinheiro é um cara bem egoísta que só liga para as suas próprias necessidades, tomando medidas drásticas até mesmo com aqueles que o ajudaram a sobreviver para realizar suas ambições. Isso não impede que ríamos com as tiradas que solta sempre que está em tela, geralmente alguma coisa relacionada ao mar, algum ato de desespero, algum comentário sobre algo ou alguém – sempre falando mau, é claro – e o jeito como ele trata a Lana, sempre a chamando de “Lana-chan” como se estivesse apaixonado. Tirando suas atitudes mesquinhas, que vão sumindo aos poucos, acho que o Dyce é meu personagem favorito da série.
LOCALIDADES
Algo que me deixou fascinado nessa série foi o design dos cenários e a arquitetura dos locais onde ela se passa, especialmente Industria. Este local acho que é um dos mais bem pensados que já vi em qualquer animação. A arquitetura principal é composta por três torres interligadas, formando um complexo chamado Triangle Tower. Neste lugar vemos todo tipo de tecnologia que só pode ser encontrada lá, como fábricas de produtos sintéticos, salas de controle com diversos radares e painéis de LED, armas lasers que se projetam para fora das paredes da torre, e claro, portas que são acionadas por sensores. Pouca coisa é feita manualmente em Industria. Os planos que o diretor faz neste local procuram mostrar o quão vazio e desprovido de vida ele é.
A Triangle Tower.
Para se locomover entre as torres, a pessoa pode escolher andar pelos fundos de cada uma delas, onde há um vão imenso no formato de um triângulo que chega a ser assustador. Lá existem portas que levam para diversas áreas diferentes de cada torre. A segunda opção, reservada para os oficiais do local e, claro, para os invasores, é usar umas espécies de escorregadores que conectam aos lugares mais importantes do complexo, como às salas de controle, às fábricas e ao subterrâneo. Este último é a área mais complexa de toda a Industria. É como se fosse um enorme labirinto, cheio de túneis e que se expande até os confins da Terra (ok, estou exagerando, mas é quase isso). Em uma seção dele há uma área residencial, onde vivem escravos e pessoas subordinadas por Lepka. O local é tão extenso e labiríntico que os moradores dessa área que se rebelaram contra as autoridades conhecem caminhos e passagens secretas que não constam no mapa oficial. A superfície de Industria, com a Triangle Tower e as ruas desertas, se comparada em tamanho com o subterrâneo é como se fosse a internet que navegamos contra a Deep Web.
Um mapa esquemático de Industria.
Contrastando em demasia com o território altamente tecnológico de Industria, temos High Harbor, a vila onde Lana foi criada, um local onde nenhum tipo de tecnologia jamais pôs seus pés, onde apenas a natureza reina soberana. É o mundo dos sonhos de Miyazaki, uma cidade utópica repleta de tudo aquilo que é natural por todos os lados. Os planos dão muita ênfase nessa questão, procurando mostrar toda a fauna e flora que lá habita, uma característica sempre presente nos trabalhos do diretor. Até mesmo a parte industrial da vila é movida apenas pelo vento, sem nenhuma intervenção que “danifique o mundo como ele deve ser”. Acredito que seja por este fato que Miyazaki fez High Harbor ser a única localidade que não afundou no mar durante o Grande Desastre, algo que não os privou de sofrerem os efeitos deste, o que os fez passarem por enormes adversidades. Porém, eles as superaram e conseguiram fazer do local o maior exemplo de sinergia entre humanidade e natureza, onde todos se ajudam sem fazer nenhum mal a ela.
Um mundo perfeito para se viver como imaginado por Hayao Miyazaki.
Esses dois locais descritos acima são os principais da série, praticamente a trama inteira se passa neles. Mas fora eles, temos a ilha onde Conan foi criado, Remnant Island (algo como “A ilha que restou”), e, apesar de ficarmos pouco neste lugar, a ilha de Jimsy, My Island, que se destaca pelo seu nome cômico.
TRILHA SONORA
Um aspecto que eu não poderia deixar de abordar nesse artigo é a trilha sonora da série. Nos anos 80, a trilha musical de quase todas as produções audiovisuais eram sintetizadas, ou seja, o sintetizador era o instrumento que conduzia todas as músicas e às vezes era o único usado. Future Boy Conan, apesar de ser do final dos anos 70, já começava a usar esse tipo de trilha que viria a ser padrão alguns anos à frente. Porém, diferente da maioria das produções da década seguinte, onde todo instrumento era sintetizado, até mesmo guitarra, bateria e baixo, o som de Conan, além do sintetizador, conta com uma banda de verdade e uma orquestra, o que dá um ar mais agradável às composições. Praticamente todas as músicas tem um ritmo bem acelerado que, no começo, você até estranha, pois parece não combinar muito, mas depois elas começam a te cativar mais do que deveriam e te ambientam na situação melhor do que qualquer outra trilha sonora oitentista. Um exemplo disso são as cenas de ação e perseguição, que sempre contam com as duas composições que você ouve logo abaixo.
Claro que a série também conta com músicas mais calmas, como a tema da Lana e do Conan, que é tocada sempre que eles estão compartilhando um momento de harmonia ou de ternura, uma combinação linda entre imagem e áudio, e também conta com temas cômicos, já que esse fator está presente em grande escala em Future Boy Conan. Agora outra composição que acho fantástica é a tema de abertura. Sabe aquela música que te passa uma positividade enorme e te faz dar valor ao mundo em que vive? Essa é uma delas. Quando você vê o Conan e a Lana no mar junto das letras “Nade, faça ondas! Corra, chute o solo!” e depois eles dois correndo em um morro gramado ao som de “Cante, mostre a sua voz! Dance, junte suas mãos!” a vontade que você tem é de fazer exatamente o que é dito e mostrado na tela.
REFERÊNCIAS MIYAZAKIANAS
Como havia dito um pouco na seção TEMAS, essa série contém diversos temas (redundância, alô?) que seriam usados extensivamente ao longo de sua carreira, mas isso não se restringe apenas a questões narrativas – Conan conta com diversas características e estéticas que apareceriam em diversos filmes de Hayao Miyazaki, como similaridade entre personagens e suas ações. Abaixo listarei as que consegui perceber.
Conan e Pazu (O Castelo no Céu). Dois personagens não só visualmente semelhantes em suas aparências, mas também em suas ações e habilidades. Ambos são exímios escaladores de, hmm, qualquer tipo de estrutura e são fortes até de mais para a sua idade. Ah, e nenhum deles hesita na hora de arriscar a própria vida para salvar uma garota que acabou de conhecer.
Lana e Sheeta (O Castelo no Céu). Duas garotinhas com poderes especiais que estão sendo constantemente raptadas por autoridades e piratas por serem a chave para uma tecnologia perdida. São bem similares em aparência também, com direito a tranças e àquele olhar de deixar qualquer um com dó. Mas não deixe que o rostinho frágil delas o engane, porque elas não pensam duas vezes na hora de atacar fisicamente aspirantes a ditador.
Lepka e Muska (O Castelo no Céu). E falando em aspirantes a ditador, cá estão os antagonistas de Conan e Laputa. Muska é como se fosse o Lepka depois de um rigoroso regime e uma bela plástica, mas os dois agem quase que identicamente, não medindo esforços para realizarem suas ambições de dominar o mundo com uma tecnologia perdida. Só que na hora que a situação esquenta pro lado deles, vemos como esses caras sem escrúpulos se desesperam.
Tratando-se de narrativa, a maneira como as protagonistas femininas de Conan e Laputa são encontradas é muito similar. Uma aparece na beira da praia desmaiada após fugir de um navio pirata e a outra despenca de um dirigível ao fugir de piratas, aterrissando nas mãos de Pazu, desmaiada. Ambos os garotos se espantam ao achá-las.
Ok, essas duas cenas podem não ter muita relação entre si, pois a Lana se comunica com os pássaros, enquanto estes só estão comendo ração na mão de Sheeta, sem nenhum vínculo telepático, mas creio que Miyazaki quis referenciar a relação que a protagonista de Conan tinha com as aves nessa cena de Laputa.
Ao tentar impedir que o vilão ou um cara mal faça algo para machucar o protagonista, a mocinha é jogada para longe com tudo e colide com força na parede. Esse cenário está presente em alguns filmes do diretor, mas foi originado nessa série (aparecendo mais de uma vez).
Aqui temos algo que pode ou não ser uma referência. O Jimsy adora comer sapos e répteis tostados, fazendo de tudo para conseguir um. Isso me lembrou bastante aquele funcionário da casa de banho que adora comer lagartixa em A Viagem de Chihiro.
Uma árvore enorme e imponente sendo olhada de baixo, as pessoas que o fazem maravilhadas. O plano na tela nos mostra a visão de quem está a vendo com todos os detalhes possíveis para que tenhamos a mesma sensação que o personagem. Esse tipo de cena aparece em diversas produções em que o Miyazaki está envolvido, sendo a primeira vez em Heidi, A Garota dos Alpes. A árvore é como um corpo celestial e sagrado para o diretor, então acho que isso explica o motivo desse tipo de plano ser tão explorado em seus filmes.
Giganto e Goliath (O Castelo no Céu). Duas aeronaves bélicas de proporções extraordinárias que destroem qualquer outra máquina voadora que apareça em sua frente. São bem semelhantes e utilizadas pelo antagonista de ambas as obras.
Essa aqui não é uma referência nem nada, só algo que ressoou em mim. O momento em que o Conan faz um joinha para seus amigos no topo de uma nave me lembrou quase que instantaneamente quando Nausicaä faz o mesmo para confortar o povo de seu vale no filme Nausicaä do Vale do Vento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No fim das contas, o primeiro trabalho diretorial de Hayao Miyazaki é tão bom quanto algumas de suas futuras obras, abordando temas que se tornariam um marco em todas as suas produções de uma maneira convincente e inspiradora para as novas gerações dos anos 70, com um trabalho magnífico de construção de cenários, locais e profundidade de personagens. Future Boy Conan pavimentou o caminho para futuras direções que o tornariam a figura mundialmente conhecida que é hoje.
-por Vinicius "vini64" Pires
Leia também meus outros textos sobre trabalhos do Studio Ghibli e relacionados:
- Heidi, A Garota dos Alpes (Isao Takahata, 1974)
- Marco (Isao Takahata, 1976)
- Anne of Green Gables (Isao Takahata, 1979)
- Meu Vizinho Totoro (Hayao Miyazaki, 1988)
- Sussurros do Coração (Yoshifumi Kondo, 1995)